National Geographic - Portugal - Edição 235 (2020-10)

(Antfer) #1

encontrar formas de ganhar dinheiro com a floresta
que não impliquem a desflorestação de enormes
áreas. “Estamos a queimar a floresta com maior
biodiversidade do mundo para criar meia dúzia de
vacas magras”, diz. “Para travar a desflorestação,
precisamos de descobrir uma maneira inteligente
de integrar a Amazónia na economia global.”
As boas notícias, acrescenta, residem no fac-
to de os brasileiros poderem de facto ganhar
dinheiro sem derrubar árvores. Segundo vários
estudos científicos, a apanha de castanha do
Maranhão e a aquicultura são mais lucrativas e
sustentáveis do que a criação de gado. O turismo
poderá ser outra alternativa viável.
Em Dezembro de 2016, Everton entrou em
contacto com Charles Munn, co-fundador e pro-
prietário da SouthWild, uma empresa de eco-


turismo sediada em Cuiabá, no Brasil. Passado
um mês, tinham um contrato assinado. “Existe
um grande número de cientistas interessados
em investigação fundamental, sem quererem
aplicar as suas conclusões em soluções de sus-
tentabilidade”, diz Charles. “O Everton é invul-
gar porque também se preocupa genuinamente
em criar postos de trabalho ecológicos e prote-
ger a natureza.”
Charles Munn organiza safaris fotográficos
de luxo na América do Sul e tem um historial
de acções lucrativas associadas à conservação.
Foi o primeiro a trazer turistas para ver os famo-
sos jaguares na região brasileira do Pantanal, a
maior zona húmida tropical do mundo. Um es-
tudo mostrou que o turismo dos jaguares gerou
cerca de 5,9 milhões de euros anuais em recei-
tas em sete unidades hoteleiras do Pantanal. Os
criadores de gado que beneficiam do turismo já
não matam jaguares, mesmo que estes matem as
suas vacas de vez em quando.
“É uma espécie de capital de risco, mas com
animais selvagens”, resume Charles. “Tentamos
perceber o que poderá funcionar para levar-
mos estes animais a protegerem o seu habitat
de nós.” Em Julho de 2020, Everton já recrutara
35 proprietários com ninhos de harpia nas suas
terras para se juntarem ao programa. Quando
os ninhos geram uma cria, a empresa de Char-
les Munn contrata membros das populações
locais para construírem torres de vigia com qua-
se trinta metros de altura para uso turístico. Os
proprietários recebem 17 euros por visitante, por
dia, e outros membros da comunidade ganham
dinheiro como carregadores, motoristas e co-
zinheiros. Charles Munn garante aos clientes o
avistamento de uma harpia no horizonte... ou o
reembolso do seu dinheiro.
Everton Miranda acredita que Mato Grosso po-
derá, um dia, atrair cerca de setecentas pessoas
por ano para verem ninhos de harpia. Isso seria
lucrativo para a empresa de Charles Munn e uma
vantagem inesperada para as harpias.
Everton está determinado em garantir o futuro
das harpias e a biodiversidade que representam.
Planeia fundar um instituto de predadores em
Alta Floresta no próximo ano, dedicado a fomen-
tar os trabalhos de investigação de base e o desen-
volvimento de soluções práticas. “A conservação
na Amazónia só será eficaz se quem lá vive se en-
volver e acreditar no processo”, diz. “Mais cedo ou
mais tarde, vamos perceber que a Amazónia é o
maior bem do Brasil.” j

HARPIAS 97
Free download pdf