Revista de Vinhos - Edição 371 (2020-10)

(Antfer) #1
CERVEJAS

Uma Nortada


de ar fresco


“Foi um projeto sacado a ferros”, começa por dizer Pedro Mota,
CEO da Nortada. Não é para menos, sobretudo quando se olha à
dimensão da cervejeira, do projeto e do investimento ali concretizado,
no centro do Porto, na Rua de Sá da Bandeira. “A ideia surgiu em 2013,
minha e de um sócio que agora já não está connosco. Trabalhávamos
em empresas não ligadas ao setor mas que tinham negócios com cer-
vejeiras. E vimos ali uma oportunidade”, recorda o empresário que
imaginou uma cervejeira artesanal profissionalizada e com uma visão
de mercado bem definida. O próximo passo foi o desenho do plano
de negócio e um posterior “roadshow” para angariar capital. “Foi um
processo que demorou quase dois anos. Fizemos dezenas e dezenas
de apresentações do projeto a pessoas muito diferentes. Da indústria
à restauração, passando por áreas totalmente alheias. Portugueses e
estrangeiros. E no final do verão de 2015 tínhamos já 75% do capital
desejado – cerca de três milhões de euros – que ficaram totalizados
no final desse ano. Depois foi tempo de finalizar o plano de negócios,
levantar o capital, criar uma sociedade anónima com a entrada dos
sócios e arrancar finalmente com o projeto, passando do papel para
um prédio inteiro no Porto”.

Bairrista mas não tanto

A regionalidade da Nortada termina quando o objetivo de ter uma
boa base local está cumprido. “Sabemos que muitas marcas de cerveja
artesanal, para se estabelecerem, têm uma base sólida associada a uma
cidade ou a um local. A Nortada é do Porto e é identificada como tal
mas somos também do resto do país”, explica Pedro Mota. “O Porto
tem um bairrismo reconhecido e isso ajuda-nos a criar a marca. Mas
repare: somos Nortada. E nortada temos de Valença até Sagres, o tão
tradicional vento fresco que se faz sentir na praia”, sublinha.
A Nortada veio então agitar águas com cinco cervejas iniciais, espe-
cialmente feitas para serem “entradas de estilo”, isto é, são cervejas
artesanais, sim, mas acessíveis. Pedro Mota dá o exemplo da IPA da
marca, feita para principiantes. “É a nossa segunda cerveja mais ven-
dida, depois da Lager, e trata-se de uma IPA bebível. Ou seja, uma cer-
veja para quem vem das industriais não sentir um choque brutal. Com

um projeto desta dimensão, temos obrigatoriamente de ter volume.
São três milhões de euros investidos inicialmente, a que se juntaram já
seguramente mais dois milhões de euros em melhorias. Não podemos
fazer cervejas de nicho”, remata. Com o portefólio base bem assente,
em velocidade cruzeiro, as cervejas para públicos restritos podem até
surgir e isso já vem acontecendo. “Este ano, por exemplo, estamos a
lançar uma cerveja em cada mês. Pequenos lotes experimentais. Se
forem bem recebidas, avançamos para produções maiores”, conta o
cervejeiro que tem como exemplo mais bem-sucedido a “Obrigado”.
Uma cerveja feita em parceria com a Dott, de agradecimento aos pro-
fissionais de saúde que estiveram na linha da frente da pandemia e
cujos lucros revertem totalmente para a Cruz Vermelha Portuguesa.

A cerveja como o vinho

Pedro Mota vê muitas semelhanças no caminho da cerveja artesanal
dos últimos anos e o do vinho nos anos 90 e início dos anos 2000.
“Em Portugal, um país de vinho, tínhamos algumas marcas de topo.
Com a evolução tecnológica e de conhecimento, passamos a ter cen-
tenas de marcas de topo, com vinhos extraordinários. A cerveja está a
fazer esse caminho. A concorrência aumentou, o número de marcas
também, com mais técnica e conquista de mercados”, refere.
No próximo ano, espera-se da Nortada um caminho um tanto dife-
rente dos últimos anos. O portefólio fixo e de massas mantêm-se mas a
experimentação vai ter um lugar mais visível. “Queremos fazer crescer
alguns projetos considerados hoje de nicho. Se funcionarem bem,
passam para a nossa linha ‘mainstream’, explica Pedro Mota que vê
a necessidade de formar públicos. A pensar também nisso, e a vários
níveis de educação, a Nortada estabeleceu uma parceria com a Escola
Superior de Cerveja e Malte, de Santa Catarina, no Brasil. “Temos
um colaborador nosso que foi professor lá e percebemos que havia o
desejo desta reconhecida escola entrar na Europa. Viram em nós, pela
dimensão, um bom parceiro e vamos ter cursos de vários tipos e para
públicos diversos, dos mais amadores até aos mestres cervejeiros, com
aulas práticas na fábrica da Nortada”, anuncia Pedro Mota.

Toda a gente lhe conhece o nome. Chegou ao mercado com força: na
comunicação, na marca, no volume e até na fábrica, bem no centro do Porto,
para que toda a gente a visse. Apesar do ano difícil, em 2020 está a lançar 12
cervejas, uma por cada mês. E tem planos para os próximos anos.

Para ver e ouvir


texto Luís Alves / notas de prova Luís Alves e Marc Barros / fotos Ricardo Garrido

56 · Revista de Vinhos ⁄ 371 · outubro 2020 @revistadevinhos
Free download pdf