Clipping Banco Central (2020-10-15)

(Antfer) #1

José Ruy Lozano - Voltar à sala de aula para reinventá-la


Banco Central do Brasil

Folha de S. Paulo/Nacional - Tendência e Debates
quinta-feira, 15 de outubro de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas

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Autor: José Ruy Lozano


Escola já não pode mais se estruturar como mera
transmissora de conteúdos


José Ruy Lozano
Sociólogo e autor de livros didáticos,émembro da
Comunidade Reinventando a Educação (coreduc.org)


"Uma escola é uma fábrica é um poema é uma prisão é
academia é tédio, com flashes de pânico.” A frase do
poeta russo Joseph Brodsky, retirada de um de seus
ensaios autobiográficos, diz muito sobre as imagens
associadas à instituição escolar ao longo do tempo —de
centro de difusão de conhecimento e formação humana
até estabelecimento repressivo normatizador de
condutas. Nas últimas semanas, porém, a expressão
"flashes de pânico” pode defini-la melhor, diante da
iminente autorização para o retorno às aulas presenciais
em meio à pandemia de Covid-19.


O receio do contágio é plenamente justificado diante de
números que não cedem, ou cedem lentamente. Mas o
retorno às atividades presenciais nas escolas pode
desencadear outros medos, frustrações ou, pelo menos,
necessidades de adaptação —e não apenas no que se
refere a normas de higiene e distanciamento.

Em pouquíssimo tempo, e de forma quase heroica,
educadores do mundo todo fizeram a transferência de
sua atuação presencial para o espaço virtual, com
maiores ou menores recursos e êxitos. No ambiente on-
line, no entanto, vemos com frequência a aula como
commodity: mera transmissão de informações. O
professor fala, o aluno escuta. De aulas assim, o
YouTube está cheio, sobre todos os tópicos tradicionais
da educação básica. Por que investir tempo e
disposição para assistir ao professor, se posso acessar
os mesmos conteúdos com recursos visuais mais
interessantes e "professores” por vezes mais divertidos?

A adaptação forçada aos meios virtuais e a constatação
da reprodução de práticas analógicas no universo digital
devem levar os educadores a uma importante
reflexão:como aproveitar ao máximo a permanência do
aluno em sala de aula? A presença do estudante diante
do professor, de cuja falta tanto nos ressentimos, é
fundamental para quê? Se conteúdos e treinamentos
podem ser disponibilizados em vídeos, o que fazer
quando estivermos de volta às escolas?

Se há alguma herança positiva do período de pandemia,
em meio a um cenário tão desolador, é a constatação
de que a escola já não pode mais se estruturar como
transmissora de conteúdos. Além de seu fundamental
papel na socialização e na aprendizagem de tudo o que
ela envolve (cooperação, solidariedade, respeito ao
outro e ao espaço público), sua função contemporânea
é desenvolver a reflexão —crítica, problematizadora,
cidadã— sobre conceitos e informações há muito
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