10 VISÃO 15 OUTUBRO 2020
OPINIÃO
HISTÓRIAS
DA CAPAOE 2021: Um orçamento
“nem-nem”
A
promessa era grande: um orça-
mento bom para as famílias e
amigo das empresas, que promova
a recuperação e a competitivida-
de da economia. Na declaração de
intenções vem, pois, toda a cartilha
de finanças públicas: um “orça-
mento responsável e progressis-
ta” que “continua a apoiar as famílias e as
empresas, através de medidas que visam
proteger os rendimentos, apoiar o emprego,
aumentar a liquidez das empresas e mitigar
as consequências sociais da crise económica”,
em suma, “um orçamento que não aumen-
ta impostos”, “marcado pela aceleração do
investimento público”.
Entre o que se diz nos preâmbulos ou a
propaganda que é feita nas apresentações e
as medidas que estão efetivamente inscritas,
vão, como de costume, quase 400 páginas e
alguns cálculos de distância.
É verdade que os impostos não vão ser
aumentados, ficando todas as taxas inaltera-
das e não havendo qualquer atualização dos
impostos indiretos. Entre as medidas mais
“generosas” do lado dos rendimentos para
os contribuintes, estão o aumento do salário
mínimo em €23,75, a subida do subsídio de
desemprego em €66 e o aumento extraor-
dinário das pensões em €10. E também um
novo apoio extraordinário ao rendimento
dos trabalhadores, que protege recibos ver-
des, domésticos e desempregados sem sub-
sídio, assim como o subsídio de doença por
isolamento profilático e o subsídio de doença
por Covid-19 – medidas de apoio social rele-
vantes em tempos de pandemia.
Mas também é verdade que há propostas
que são pouco mais do que fogo-de-vista: a
redução de 2% da retenção na fonte no IRS é
apenas um muito ténue alívio fiscal: estamos
a falar de 1 a, no limite, 16 euros por mês a
mais para o orçamento familiar. É que os
badalados 200 milhões representam apenas
7% de todo o reembolso de IRS. A mesma
coisa para a ideia do IVAucher. É criati-
va, sim, senhor, visa estimular o consumo
no primeiro semestre deste ano através da
recuperação do IVA gasto em restauração,
hotelaria e cultura durante três meses no
trimestre seguinte, mas vale apenas outros
tantos 200 milhões de euros. Não virá daqui
certamente um boom de consumo privado
para estes setores.A maior desilusão foi mesmo para os
empresários. Quem esperava medidas fortes
de apoio ao investimento, ao emprego e ao
comércio, como subsídios ou incentivos
fiscais, recebeu uma palmadinha nas costas
pelo esforço até aqui e uma mão-cheia de...
quase nada. Não se vislumbram medidas
que nutram efeitos significativos nas contas
das empresas. O Governo reservou apenas
309 milhões de euros para pagar em 2021
despesas inerentes ao mecanismo de apoio
à retoma progressiva, que substituiu o layoff
simplificado que termina a 31 de dezembro
deste ano, admitindo um prolongamento. E
pouco mais.
Os keynesianos otimistas dirão que os
estímulos para a economia e para o consumo
virão da forte despesa pública, que ascenderá
ao impressionante número redondo de 100
mil milhões de euros. É muito dinheiro, é
verdade: são mais cerca de três mil milhões
face à estimativa de 2020. Mas, no entan-
to, em termos percentuais o aumento não
é enorme: cresce apenas 3,9%, e o peso da
despesa pública no PIB até cai de 49,9%,
para 47,8%.
Otimismo há muito, precisamente aqui,
no PIB. O cenário macroeconómico do Go-
verno prevê a conhecida forte contração em
2020 de 8,5%, mas um crescimento de 5,4%
no próximo ano. Ainda quase 4 pontos per-
centuais abaixo do registado em 2019, mas a
subir significativamente.
Contas feitas, quem esperava que João
Leão trouxesse caça grossa e fresca para ani-
mar a selva recebeu pouco mais do que uma
presa miúda. Nada de refeições fartas para
o pessoal, só algo frugal para aconchegar
a fome em tempos áridos. Estamos feliz-
mente longe da austeridade, é verdade, mas
não vem aí o dinheiro às pazadas para cima
da economia que muitos ansiavam. Tenta-
-se um exercício difícil: manter os níveis de
prestações sociais e apoios face à Covid-19,
ao mesmo tempo que se reduz défice e ree-
quilibra os indicadores que resvalaram em- E assim este é um orçamento “nem-
-nem”: nem corta nem acrescenta grande
coisa. Nem aquece nem arrefece: é contido
e remedia. O problema é sempre o mesmo:
é que se puxa para cá e puxa para lá, mas a
manta continua a ser a mesma e, como sabe-
mos, é curta. Sobretudo para quando o frio
aperta. [email protected]
POR MAFALDA ANJOS / DiretoraNesta capa
sobre animais,
decidimos dar
visibilidade a um
projeto muito
meritório, Be
My Friend
(@bemyfriendpt,
no Instagram),
que fotografa
animais
abandonados ou
em instituições
para ajudar a
encontrar novos
donos.Como é tão difícil
escolher entre
tantos animais
adoráveis, vamos
fazer quatro
capas. E, dentro
da revista, todo
o artigo será
paginado com
estas imagens.