Clipping Banco Central (2020-10-17)

(Antfer) #1

O Supremo não é legislador


Banco Central do Brasil

O Estado de S. Paulo/Nacional - Notas e Informações
sábado, 17 de outubro de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas

Clique aqui para abrir a imagem

Com especial habilidade, o presidente do Supremo
Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux, soube
desfazer o que poderia se tornar uma crise de maior
vulto, no caso do habeas corpus em favor de André do
Rap. A finalidade da Justiça é dar solução aos conflitos,
e não aumentá-los ou perpetuá-los.


O mérito do ministro Luiz Fux foi possibilitar uma rápida
resposta do colegiado, colocando sob escrutínio do
plenário do Supremo sua decisão de suspender a
liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio. Diante de
um cenário no qual a Corte é diariamente questionada -
e muitas vezes afrontada -, o fortalecimento institucional
do STF inclui necessariamente o fortalecimento de sua
colegialidade.


Por 9 votos a 1, o plenário do STF manteve a prisão
preventiva de André do Rap, confirmando a decisão do
ministro Luiz Fux. Os votos ressaltaram o caráter
excepcionalíssimo da possibilidade de o presidente da
Corte suspender ato jurisdicional de outro ministro do
sTf, como ocorreu no caso. A presidência do tribunal
não é órgão revisor, e o que ocorreu neste caso não é a
regra. As exceções devem continuar sendo exceções.


Se é positivo o caráter colegial da resolução do caso -
afinal, o STF é um órgão colegiado -, é certo também
que o conteúdo da decisão merece ressalva. O
entendimento fixado pela maioria dos ministros do
Supremo não apenas acrescenta elementos
inexistentes na lei, como acaba por excluir precisamente
uma das principais inovações que o Poder Legislativo
trouxe com a Lei 13.964/2019 - a ilegalidade de toda
prisão preventiva que não é renovada periodicamente.

O Código de Processo Penal diz: "Decretada a prisão
preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a
necessidade de sua manutenção a cada 90 dias,
mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de
tornar a prisão ilegal" (art. 316, § único). Já o Supremo
disse: a inobservância da reavaliação no prazo de 90
dias não implica a revogação automática da prisão
preventiva, devendo o juízo competente ser instado a
reavaliar a legalidade e a atualidade de seus
fundamentos.

Assim, pela decisão do Supremo e em sentido contrário
ao que determinou o Congresso, a prisão preventiva
que se estende no tempo sem ser renovada perde a
conotação categórica de ilegalidade. Fosse de fato
ilegal, como dispõe a Lei 13.964/2019, haveria de ser
concedida a ordem de habeas corpus em favor de quem
está preso preventivamente sem a devida reavaliação
periódica dos fundamentos.

Na tentativa de justificar a decisão do Supremo, alegou-
se que os ministros fizeram uma interpretação sistêmica
do Código de Processo Penal, adequando a literalidade
da lei ao ordenamento jurídico como um todo, em
especial aos princípios constitucionais relativos à ordem
pública. Chama a atenção, em primeiro lugar, a
proximidade dessa tese com o ativismo judicial, postura
habitualmente condenada por quem agora defende o
dever do Supremo de matizar as con- sequências da Lei
13.964/2019.

O equívoco da decisão do STF não foi, no entanto, uma
Free download pdf