Clipping Banco Central (2020-10-17)

(Antfer) #1

Estado alterado


Banco Central do Brasil

Folha de S. Paulo/Nacional - Opinião
sábado, 17 de outubro de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas

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Série de reportagens mostra como país fica para trás no
debate sobre políticas relativas a drogas


Uma das políticas em que o Brasil anda mais atrasado é
a descriminalização do uso de drogas. Tentativas
modestas de arejar o tratamento da questão sob o
prisma da saúde pública tropeçam na mescla de
obscurantismo e conservadorismo iliberal, exacerbada
agora pelo governo de Jair Bolsonaro.


Prevalece no país a ênfase na repressão ao tráfico,
tornado tão mais rentável quanto mais cruenta e
prolongada a chamada guerra às drogas. Também
fracassada, pois nem a venda nem o consumo se
reduzem, multiplicam-se as mortes em confronto com a
polícia e entre facções, e as cadeias superlotadas
realimentam a violência.


O fiasco nacional ressalta da série Estado Alterado,
nesta Folha, que comparou ao longo de dois meses as
políticas de drogas na Europa, na Ásia e nas Américas.


O oitavo e último capítulo contemplou o Brasil e retratou
as favelas do Rio como emblema do enfrentamento que


resulta em vítimas inocentes do fogo cruzado e no
encarceramento ou na morte violenta de jovens, em
geral negros.

Em contraste, Uruguai e Portugal avançam na
descriminalização, ainda que adotando modelos
diversos, com percalços e sucessos que se devem
examinar detidamente. Empresas de Israel faturam com
avanços tecnológicos no setor de maconha medicinal,
enquanto o varejo no estado americano do Colorado se
diversifica.

Em Ohio, a polícia se torna promotora de saúde ao
bater de porta em porta para oferecer tratamento e
reabilitação a dependentes de opioides. Agentes
circulam com spray nasal de naloxona, medicamento
que pode desviar uma pessoa da morte certa por
overdose, causadora de mais de 70 mil óbitos anuais
nos Estados Unidos.

No Brasil, Osmar Terra, então ministro da Cidadania,
censurou pesquisa da Fiocruz em 2019 por não
confirmar a suposta epidemia de crack de que fazia
cavalo de batalha e por mostrar que o problema maior é
o álcool. A Anvisa autorizou medicamentos à base de
maconha, mas vedou seu plantio, impondo custosas
importações.

Desde 2006 o consumo individual não deveria redundar
em prisão, mas policiais e juízes enquadram como
traficantes os portadores pobres e negros, condenando-
os ao abrigo de facções que dominam penitenciárias. O
Supremo Tribunal Federal posterga desde 2015
julgamento sobre o tema.

Na atual conjuntura política, só o Congresso ou o STF
poderiam dar impulso ao debate. Mas parlamentares e
ministros não parecem empenhados em levar à frente
essa pauta verdadeiramente liberal.

Assuntos e Palavras-Chave: Cenário Político-
Econômico - Colunistas
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