Clipping Banco Central (2020-10-18)

(Antfer) #1
Banco Central do Brasil

Folha de S. Paulo/Nacional - Ilustrada
domingo, 18 de outubro de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas

O Altas Horas, que tem apresentação e direção-geral de
Serginho, completa duas décadas nesta semana. O rito
de passagem não será celebrado com bolo nem chuva
de confete, porém. "Não dá para ser desrespeitoso com
o que está acontecendo lá fora. Não dá pra dar o mau
exemplo. Eu até podería fazer uma festa virtual, mas
resolví como um valor: não vai ter festa."


A debandada dos estúdios provocada pela Covid-19
desmanchou os planos para a comemoração dos 20
anos, que iam de reuniões de bandas que não existem
mais ou não estão completas, como os Titãs, à ideia de
distribuir câmeras em cidades para que as pessoas
gravassem uma mensagem.


"Quadros não faltavam, sabe? Agente ia usar muito o
arquivo do programa para procurar pessoas da platéia,
saber onde e como elas estão hoje", afirma. "Vai ficar
para o ano que vem, não tem problema. Quer dizer, se
tudo correr bem para o ano que vem, né? Nós somos
espectadores nessa Covid, e não protagonistas."


Se do ano 2000 para cá a atração passou por
mudanças de cenários, renovação de quadros e
diferentes faixas de horários (o Altas Horas já chegou a
ser apresentado entre 3h e 5h da manhã), a platéia se
consolidou como um membro permanente. "O
espectador do programa não vem só para assistir, ele
vem para interferir de alguma maneira."


A tradição foi herdada da passagem do apresentador
por outras emissoras na década de 1990, como a TV
Cultura, onde comandou o Matéria Prima, e pelo SBT,
quando apresentou o Programa Livre.


"Eu estava muito bem na TV Cultura e recebi uma
ligação do Silvio Santos. Eu achava o SBT 'popularzão
demais. Ele falou: 'Vem fazer o seu programa aqui
porque mais gente vai ver o que você está fazendo. Eu
falei: 'E a liberdade?. E ele disse: 'Vai falar com o Jô,
pergunta para a Hebe, Boris Casoy e Marília Gabriela
se eu dou ou não liberdade."


"Eu desci e vi aquele lugar cheio de gente. Bozo, Vovó
Mafalda, O Homem do Sapato Branco, aquela multidão


de gente diferente. Pensei: 'Putz, isso é a televisão
brasileira."

"Eu sou da época que a minha relação com o
espectador era por cartas e por telefone, o que parece
hoje muito dinossauro. Mas à medida em que as coisas
começaram a acontecer, eu sempre fui muito atento
para observar e praticar", pondera sobre o surgimento
de novas plataformas.

Uma das reflexões que orientam o seu trabalho, conta,
é a de não subestimar o público que o assiste. "As
pessoas falam que a televisão molda uma sociedade,
como se a sociedade estivesse sentada em frente à TV
e aceitasse tudo o que ela propõe. Como senão
houvesse amanhã, como se a pessoa não fosse acordar
no outro dia e pegar um ônibus, pegar o metrô,
trabalhar."

"Eu não faço editoriais porque acredito muito no poder
de absorção e reflexão da sociedade brasileira. Às
vezes eu dou palestras e há essa preocupação sobre
manipulação. Eu pergunto quantos se sentem
manipulados, mas ninguém levanta a mão. As pessoas
acham que sempre são os outros os menos inteligentes
e capacitados. Ninguém acha que é moldado pela
televisão, mas que os outros, sim."

Apesar da polarização gerada por pautas identitárias no
país, o apresentador considera fundamental que elas
sejam discutidas pelo entretenimento televiso. "Se você
for se curvar a pessoas que não estão querendo ouvir
argumentos, não tem sentido você seguir onde está. É
exatamente nesse momento, de total conservadorismo
e de intolerância, que cabe às pessoas abrir espaço
para quem não pode se expressar."

"Esse espírito de intransigência gera o espírito de
violência também. E não é por acaso que isso esteja
acontecendo ao mesmo tempo em vários lugares.
Existe, no consciente ou até no inconsciente, uma
permissão para a violência. Mas eu sempre acredito
muito na possibilidade das pessoas começarem a se
ouvir de novo."
Free download pdf