Clipping Banco Central (2020-10-18)

(Antfer) #1

A vida negligenciada


Banco Central do Brasil

Folha de S. Paulo/Nacional - Opinião
domingo, 18 de outubro de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas

Clique aqui para abrir a imagem

Autor: Paola Carvalho


Dona Tânia foi uma das brasileiras a se inscrever, pelo
aplicativo, para receber o auxilio emergencial nos
primeiros dias de abril. Na esperança de cuidar do filho
e da sua saúde, desempregada e contando com esse
dinheiro para viver, dona Tânia teve a primeira resposta
do governo: beneficio negado porque estava morta!
Sim, aquela mulher estava morta aos olhos do governo
federal. Em desespero, começou abater de porta em
porta para provar que estava viva. E essa verdadeira
peregrinação somente gerou frutos cinco meses depois,
quando, em 21 de setembro, recebeu a primeira parcela
do auxílio emergencial no valor de R$ 600.


Dona Tânia representa milhares de histórias no Brasil,
neste país da desigualdade, da negligência para tratar
da vida, da alimentação e da sobrevivência dos mais
pobres. Não coincidentemente, dona Tânia é uma
mulher negra e mãe solo. São 43milhões de pessoas
com benefício negado desde o primeiro momento - e
que a Defensoria Pública da União estima chegar a 60
milhões.


São milhares de Tânias, Joanas, Marias e Pedros que
tentam sobreviver antes que o governo os faça morrer.
E são muitas as formas de morrer: negligência e falta de
respostas por parte do poder público; de fome, com a
insegurança alimentar grave que atingiu 10,3 milhões de
brasileiros em 2018, sendo mais da metade desses
domicílios chefiados por mulheres; e de abandono e
tristeza.

A desigualdade se aprofunda assustadoramente em


  1. Enquanto o PIB cairá 7%, o número de bilionários
    subiu 16% e a renda deles aumentou 33%. A dona
    Tânia não receberá os valores previstos na medida
    provisória 1. 0 0 0/2020 , mesmo que o erro tenha sido
    do governo federal. Os valores dos meses de maior
    dificuldade na sua vida não serão garantidos. Ela
    receberá daqui para frente, esquecendo o que passou.


A MP, além de reduzir os valores do auxílio emergencial
pela metade, ampliou significativamente os critérios
para recebimento. É a representação do abandono e do
descaso com a população brasileira. Em resposta ao El
País, em julho de 2019, Jair Bolsonaro afirmou: "Falar
que se passa fome no Brasil é uma grande mentira, é
um discurso populista", disse.

Ou seja: uma demonstração evidente de desrespeito e
desconhecimento da população brasileira. Por isso,
lançamos um abaixo-assinado a ser encaminhado aos
congressistas (www.6ooatedezembro.org.br).

Estamos atentos. A campanha Renda Básica que
Queremos e a Rede Brasileira de Renda Básica
acompanham o enterro do Renda Brasil, que já no outro
dia foi ressuscitado pela equipe econômica. Estamos na
luta para que as Tânia não sejam mais esquecidas nas
políticas de renda deste país.

É imprescindível avaliar o impacto de redução em 7%
do PIB em 2020, enquanto os muito ricos aumentam
suas fortunas. Não é mais possível esconder as
desigualdades, a fome e o desemprego. Não é mais
possível argumentar sobre falta de recursos, pois eles
Free download pdf