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Samba da fraternidade


Banco Central do Brasil

Correio Braziliense/Nacional - Opinião
segunda-feira, 19 de outubro de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas

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Autor: Irlam Rocha Lima


Vinicius de Moraes, um dos mais celebrados poetas
brasileiros, não tinha o dom da premonição. Em 1961,
ao escrever a letra de Samba da bênção ele não sabia
quem era Jorge Maria Bergoglio, que acabara de
graduar-se em filosofia pela Universidade Católica de
Buenos Aires. Cinquenta e nove anos depois, o bispo
argentino que ocupa o posto mais alto da hierarquia da
Igreja Católica, iria recentemente referir-se ao Poetinha,
de quem se diz fã, ao citar trecho da música -- "A vida é
a arte do encontro, embora há tanto desencontro pela
vida" --, na encíclica Fratelli Tutti (Todos Irmãos, em
português). No documento dedicado ao diálogo,
divulgado pelo Vaticano, o Papa Francisco faz críticas
contundentes ao consumismo, ao liberalismo
econômico, à tirania da propriedade privada e a falta de
empatia com os imigrantes.


Samba da bênção, de Vinicius de Moraes e Baden
Powell (autor da melodia) foi composto no apartamento
de um edifício, projetado por Lúcio Costa, no Parque
Guingle, no bairro de Laranjeiras, com vista para o
Cristo Redentor. Era o início da parceria desses dois


reverenciados nomes da MPB, que desaguaria nos
chamados afrosambas. Vinicius, ateu de formação
católica, a partir dali deixou claro seu envolvimento com
a cultura da matriz africana, representada pelos orixás.

Já na letra de Samba da bênção ele pedia para ser
abençoado por Senhora "a maior ialorixá da Bahia" e
por outros mestres da história da música popular
brasileira como Pixinguinha, Sinhô, Cartola, Ary
Barroso, Tom Jobim e "os grandes sambistas do Brasil
lindos como a pele macia de Oxum" e o maestro Moacir
Santos: "Não é um só, és tantos, como o meu Brasil de
todos os santos". O pedido de bênção vem sempre
antecedido da expressão saravá, originária da fala de
africanos escravizados de línguas bantas.

Mas, foi com os afrosambas, compostos em 1966 e
gravados em álbum homônimo no mesmo ano, que a
"negritude" de Vincius se acentuaria ainda mais. Tidos
como divisor de águas da MPB, eles trazem uma
sonoridade que funde elementos dos batuques
africanos -- como pontos de candomblé e toque de
berimbau -- com o samba. Entre as oito canções
reunidas no repertório chamam atenção as faixas Canto
de Ossanha (a de maior sucesso), Canto de Iemanjá,
Canto de Xangô e Lamento de Exu.

Assuntos e Palavras-Chave: Cenário Político-
Econômico - Colunistas
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