Não se esqueça do antibiótico da China
Banco Central do Brasil
Folha de S. Paulo/Nacional - Mercado
quinta-feira, 22 de outubro de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas
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Autor: Vinícius Torres Freire
Show de demagogia desvairada de Bolsonaro é o de
sempre, mas um dia a casa cai
Da longa lista de produtos que importa da China,
plataforma de petróleo é aquele em que o Brasil gasta
mais. Depois, vêm telefones celulares. Em 2019
gastamos também US$ 70 milhões em "edredons,
almofadas, pufes e travesseiros" chineses.
Qual o maior fornecedor estrangeiro de antibióticos para
o Brasil? A China, que aliás aparece em terceiro lugar
nas vendas de produtos de beleza, por exemplo.
Não dá problema, por ora, porque basicamente quase
ninguém sabe alguma coisa de comércio internacional,
porque um governador desafeto de Jair Bolsonaro não
disse que vai importar antibióticos ou pufes e porque a
milícia digital bolsonarista não se ocupou do assunto.
Até o ano passado, o Brasil comprava pouca vacina e
produtos imunológicos prontos da Chi na. As
importações maiores tradicionalmente vinham de
Alemanha, Suíça, Estados Unidos e Bélgica, com
Irlanda, Itália, Reino Unido e França logo atrás. Neste
ano, a China começou a aparecer entre os quatro
maiores.
Mas nada disso importa no nosso ambiente de
selvageria lunática. Além do mais, o Brasil fabrica o
grosso de suas vacinas, por vezes com matérias primas
importadas de vários países, como aliás é o caso de
tanta mercadoria. Até de um simples lápis de grafite.
Bolsonaro sabia o que Eduardo Pazuello andava
fazendo com a "vacina chinesa" Mas a reação dos
milicianos digitais, os discursos vitoriosos de João Doria
e a baixa vaidade presidencial, de valentão provinciano
ou síndico maníaco, provocaram o chilique ("eu é que
mando!''). O general-chefe do almoxarifado da Saúde é
menos que um ajudante de ordens do capitão, é uma
ordenança.
Já vimos esse show ruim antes, essa "stand up tragedy"
Os problemas maiores e também já muito sabidos são
outros: um desastre diplomático, perigoso para a
segurança e economia nacionais, e alguma demagogia
destrutiva em geral, como uma decisão econômica
tresloucada.
Bolsonaro tem mostrado bom instinto de
autopreservação. Tem conseguido jogar para sua
plateia desvairada e, pelo menos, não tem tomado
decisões que afastem de modo terminal os donos do
dinheiro grosso ou a média do eleitorado, até agora. Na
prática, a destruição das instituições é homeopática, por
enquanto, para 0 que a maioria não dá a mínima.
Quanto tentou um veneno em dose cavalar, com os
comícios golpistas, foi travado pelo risco de que sua
capivara tivesse consequências imediatas. A ficha
corrida de parentes e amigos por enquanto contém o
projeto de golpe.
Mas não temos como saber se assim será e se, depois
de um envenenamento contínuo, o país, sua
democracia e as instituições chegarão a uma desgraça