Um presidente contra a Saúde
Banco Central do Brasil
O Estado de S. Paulo/Nacional - Notas e Informações
quinta-feira, 22 de outubro de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas
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Em plena pandemia, o presidente Jair Bolsonaro demitiu
dois ministros da Saúde porque eles insistiram em
seguir os protocolos profissionais. Os médicos Luiz
Henrique Mandetta e Nelson Teich recusaram-se a
indicar um medicamento contra as evidências científicas
e, por isso, tiveram de deixar a pasta. O presidente
Bolsonaro queria um ministro da Saúde obediente às
suas ordens, mesmo que elas afrontassem a ciência e a
medicina. Foi assim que se chegou ao nome de
Eduardo Pazuello para o Ministério da Saúde. Tão logo
assumiu a pasta, o general de brigada ampliou, em
estrita obediência ao arbítrio do chefe, o uso de
cloroquina em pacientes com covid-19.
Ontem, o presidente Bolsonaro reiterou que, durante
seu mandato, não quer o Ministério da Saúde atuando
pela saúde pública. O que ele deseja - e assim faz valer
- é uma pasta incondicionalmente subserviente a suas
idiossincrasias políticas e ideológicas.
Na terça-feira, em reunião virtual com os 27
governadores, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello,
anunciou a assinatura de um protocolo de intenções
para adquirir 46 milhões de doses da vacina Coronavac,
desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac em
parceria com o Instituto Butantan. Era uma decisão
estritamente técnica, em benefício da população. No
momento, a Coronavac é a vacina em estágio de testes
mais avançado, tendo mostrado, até agora, os melhores
índices de segurança. Com um investimento estimado
em R$ 1,9 bilhão, a compra até o fim do ano permitiria
iniciar a vacinação já em janeiro de 2021.
Na ocasião, Eduardo Pazuello fez questão de
esclarecer eventual dúvida ou desconfiança sobre a
origem da vacina. Segundo o ministro da Saúde, a
"vacina do Butantan será a vacina brasileira", lembrando
que o imunizante, tendo sido desenvolvido na China,
será produzido integralmente no Instituto Butantan, em
São Paulo.
O anúncio do protocolo para a compra dos 46 milhões
de doses era uma excelente notícia para a população. O
governo federal, por meio do Ministério da Saúde, dava
sua contribuição para pôr fim à pandemia do novo
coronavírus. A boa notícia, no entanto, durou pouco.
Ontem, o presidente Bolsonaro fez questão de deixar
claro que seu governo não trabalha com parâmetros
técnicos e que a saúde da população não é prioridade.
Em resposta ao comentário de um jovem numa rede
social "Presidente, a China é uma ditadura, não compre
essa vacina, por favor" -, Jair Bolsonaro respondeu que
a vacina "não será comprada". Em outro comentário, o
presidente da República voltou a negar publicamente a
informação dada pelo ministro da Saúde. Diante do
pedido de uma internauta para que Eduardo Pazuello
fosse exonerado urgentemente do Ministério da Saúde,
porque ele estaria atuando como cabo eleitoral de João
Doria, governador de São Paulo, Jair Bolsonaro disse:
"Não compraremos a vacina da China".
Assim, Eduardo Pazuello tornou-se, num período de
seis meses, o terceiro ministro da Saú- de a ser
desmentido publicamente pelo presidente Bolsonaro,
simplesmente por agir de forma coerente com o
interesse público e as evidências médicas. Por respeito