Aero Magazine - Edição 317 (2020-10)

(Antfer) #1

MAGAZINE 317 | (^51)
POR | ALLAN ZIMMERMANN*,
ESPECIALPARAAEROMAGAZINE


AVIADORES


SAUDÁVEIS


Os critérios médicos adotados por autoridades aeronáuticas
para autorizar um candidato a se tornar piloto já foram
bem mais restritivos do que são hoje em dia

D


esde os tempos
do extinto DAC
(Departamento de
Aviação Civil) até os
dias de hoje, há uma
piada recorrente entre aviadores:
“Para ser piloto é preciso fazer um
exame de saúde para astronauta”.
Obviamente, hoje essa brinca-
deira passa longe da realidade.
Basta observar como evoluíram as
regras de certificação médica para
perceber o quanto a Anac e outras
agências reguladoras trabalham
para permitir que um piloto possa
voar, mesmo portando alterações
físicas ou patologias que antes re-
presentavam vetos à licença, desde
que resguardadas a segurança de
voo e a do próprio tripulante.


PRIMÓRDIOS
O desenvolvimento da aviação
foi vertiginoso. Pouquíssimo
tempo após a invenção do avião,
surgiram diversos modelos de
múltiplos fabricantes. Rapida-
mente, os militares perceberam
o potencial que as máquinas
voadoras teriam no desenrolar
de uma guerra. No período que
antecedeu a Primeira Guerra
Mundial, inúmeros países inicia-
ram uma corrida pela fabricação
de aeronaves e pela abertura de
um grande número de escolas de
pilotagem a cada ano.
O exército dos Estados Unidos
adquiriu a primeira aeronave em


1908 e, como não havia ainda di-
retrizes para o exame físico de um
piloto, foram aplicadas aos candi-
datos as regras para ser um militar
do exército. Os primeiros pilotos
americanos tinham, portanto, de
cumprir os requisitos dos militares
do exército. A avaliação principal
era dentária porque, ainda àquela
época, havia procedimentos rema-
nescentes da guerra civil, quando
os soldados tinham de abrir os
frascos de pólvora com os dentes,
o que exigia uma boa dentição.
Em 1910, a Alemanha publi-
cou os primeiros requisitos para
ser um piloto militar. Dois anos
depois, o Departamento de Guer-
ra dos EUA definiu as primeiras
diretrizes relativas aos requisitos
de saúde para pilotos militares.
Ainda em 1912, França, Itália e
Inglaterra publicaram os requisi-
tos para ser piloto militar.

TESTES EXÓTICOS
Os ingleses enfatizavam na
sua avaliação a capacidade de
se resistir à hipóxia, caracteri-
zada pela baixa concentração
de oxigênio no ar. Durante os
testes, os candidatos tinham de
respirar em uma bolsa dentro
da qual a concentração de
oxigênio ia caindo progressiva-
mente, simulando a hipóxia a
grandes altitudes. Vários can-
didatos desmaiavam cianóticos
(com pele e mucosas tomadas

por coloração azulada diante
da insuficiente oxigenação).
Os franceses, por sua vez,
tinham predileção por testar o sis-
tema vestibular (do equilíbrio) dos
candidatos após um ruído intenso.
A avaliação principal consistia em
dar um tiro próximo ao ouvido do
candidato, que deveria, logo em
seguida, andar em linha reta sobre
uma tábua no chão.
A percepção de que as neces-
sidades físicas dos aviadores eram
diferentes daquelas exigidas para
os combatentes já estava presente
nas diretrizes norte-americanas
publicadas em 1912, que passaram
a valorizar a visão a distância, a
audição e o equilíbrio. Daltônicos
não podiam ser aprovados. Ne-
nhuma espécie de correção visual
era permitida, tampouco altera-
ções em exames cardiológicos,
respiratórios ou neurológicos.
Em 1914, os exames se tor-
naram ainda mais rigorosos. Em
um dos testes, o candidato deveria
estar sentado de olhos fechados,
segurando uma agulha entre o po-
legar e o indicador, de modo que
cada um dos dedos pressionasse
uma das extremidades pontiagu-
das do objeto. Nesse momento,
um oficial disparava um tiro atrás
de sua cabeça. Logo em seguida,
era feita a checagem dos dedos.
Se houvesse um mínimo sinal de
sangue, o candidato era desqua-
lificado. Obviamente que, diante
Free download pdf