National Geographic - Portugal - Edição 236 (2020-11)

(Antfer) #1
ESTE ANO, um homem da província de
Java Central, na Indonésia, montou uma
barreira de postes de bambu, pintou a
palavra “LOCKDOWN” num pedaço de
plástico e bloqueou a estrada de entrada
na aldeia. Um agente funerário belga
começou a vestir-se para trabalhar com
um fato de protecção. Uma criança de
Detroit queixou-se de dor de cabeça
e, um mês depois, apenas 12 pessoas
tiveram autorização para comparecer
no seu funeral e o sofrimento dos pais
ficou ocultado pelas máscaras.
Eis o que este ano exigiu que com-
preendêssemos: que um único fenó-
meno liga estas pessoas, estes lugares,
esta tristeza, este medo. A maior parte
de nós não é epidemiologista ou sobre-
vivente da gripe pneumónica de 1918;
para a maioria dos seres humanos,
antes de 2020, a palavra “pandemia”
pertencia à história, à ficção distópica
ou a livros de jornalistas de ciência.
O esforço para entender o novo coro-
navírus como o verdadeiro evento glo-
bal em que se transformou é exaustivo.
Mesmo para o observador mais
experiente, o acompanhamento dos
desenvolvimentos da ciência é pertur-
bador: “Até para uma fã da ciência como
eu, tem sido inquietante observá-los a
discutir, discordar, rodopiar sobre si
mesmos e reavaliar. Já dei por mim a
desejar que algum herói vestido com
uma bata de laboratório varresse a
doença e a fizesse desaparecer”, escreve
Robin Marantz Henig nesta edição.
É um acto simultâneo de arrogân-
cia e de esperança apelidar os textos e
imagens reunidos nesta revista como
registo da pandemia – um registo é algo
para que se olha depois do aconteci-
mento, em retrospectiva. Quando che-
garemos ao fim do túnel? Vamos seguir
em frente porque temos de o fazer, mas
como e para quê? E o que nos mudou
durante este ano devastador? Estas são
algumas das questões que os jornalistas
e fotógrafos se propuseram explorar
nesta edição.

NA SUA REFLEXÃO sobre a percepção
da investigação científica num futuro
marcado pelo coronavírus, Henig
questiona-se sobre a hipervelocidade
do trabalho de laboratório, grande parte
do qual conduzido com uma abertura
sem precedentes para um público tam-
bém desesperado por um super-herói
de laboratório.

Chamamos-lhe novo coronavírus. Ou
SARS-CoV-2. Ou COVID-19. Independente-
mente do nome, o vírus dominou por
completo o ano de 2020, troçando das nossas
defesas e dominando a nossa existência.
Nesta edição, exploramos as implicações que
a pandemia tem para a ciência, o ambiente
e para as culturas de todo o planeta.

TEXTO DE

CYNTHIA GORNEY


Seguiremos em frente


depois deste ano


devastador.


Mas como e para quê?


APRESENTAÇÃO
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