Crescer - Edição 324 (2020-11)

(Antfer) #1
104 CRESCER

COLUNA –EMCONSTRUÇÃO

FOTO:BOBWOLFENSON

ámuito tempojásedis-
cute sobreapresençade
bonecasnegrasnavida
dascrianças. Fala-seso-
breaimportância dessa
representaçã oeemcomoisso as auxi-
liapositivamente.Mas hoje querodar
um saltonessadiscussão.Em1939, ini-
ciou-s eumexperimento quefoi repeti-
do na décadapassadaemváriospaíses,
chamado‘TheClarkDollExperiment’,
onde crianças brancas enegrasficavam
na frente de umabonecabrancaeou-
trapretaecomeçavamaresponder ea
adjetivaroque elas pensavam das bo-
necas. Perguntavamqualera abonita,
qual eraafeia, qual consideravam inte-
ligente, comqualgostariamdebrincar,
qual maisse pareciacom elas...
No geral, tudo oque tinhasignifica-
do positivo eraapontadocomosendo
cara cterís tica das bonecasbrancas.No
final,parachoquedenós,espec tadores,
perguntavamparaascriançasnegrasse
elas sabiam queeramnegras. Emesmo
sabendoque eram negras,ascrianças,
aindaassim,colocavam adjetivosnega-
tivosnas bonecasque eram mais pare-
cidascom elas.Issogerou um debate na
sociedade enas famílias maisatentas,
em buscadeuma solução. Empresas
queproduzembrinquedoscomeçaram
ater bonecasnegrasnos seuscatálogos,

essasbonecas passaram ater diferen-
tesprofissões, visuaisetraçosvariados,
de bebêsavampiras. Empreendedo-
resautônomos passaram afabricarbo-
necasnegrasealgo floresceu. Arepre-
sentação negraentrou na indústriados
brinquedos.Famílias negras passaram
acelebrarcadavez queuma boneca ne-
graaparecianocomercial. Aténas re-
dessociais ,osmomentosdeleveza e
diversão cresceramquandoessas bo-
necaspassaramaserreplicadaspor aí.
Aindaassim,elasnão sãoencontra-
dasemtodas as loja s, fazendodabus-
ca porumpresenteuma tarefa para os
pais procuraremloja svirtuais–como
aPretaPretinha, quefoi aprimeiralo-
ja avenderbonecas de pano negras e
inclusivas –eencomendarem. Oefeito
nascriançasévisív el.
Eu,comopai, padrinho, tio, percebo
oolhar das crianças quando recebem
essasbonecas.Algumas,por exem-
plo, nemtêm noçãodoquãopolítico
éelasteremapossibilidade de segurar
essa boneca nasmãos. Vira um obje-
to quetransformasua auto estima,sem
elas perceberem oque isso vailhestra-
zerdefrutosnofuturo. Me lembrei de
um episódio do seriadoBlack-Ishem
queuma famílianegra está conversan-
do sentadaàmesa, quando opai fala:
‘Obama éoprimeiro presidente negro

da história’. Eafilhade6anosques-
tiona: ‘Pri meiro?’. Eopai nota queela
já está numa outrafasedahistória.E
começa acontarsobre opassado de lu-
ta,tentandocriar nosfilhos umacons-
ciênciadahistória negranomundo.
Tudo isso fazparte do nossoproces-
so de construção de identidade,edessa
vez, querofazer umaprovocação: que
crianças brancas também tenham bo-
necasnegras. Éaíque elas começama
depositarseusafetos, olharaspossibili-
dades, se relacionar,criar desejoseno-
vosolhares.Umbrinquedo étambém
um ensinamentodevalores de convi-
vência.Uma criançabrancaque olha
para umabonecanegra como um po-
ço de poss ibilidades, enão como algo a
serrejeitado, éuma sementeimportan-
te aser plantada para omundo quede-
sejamos. De igualdade eafeto.

Crianças brancas, bonecas negras


Como um objeto pode transformaraautoestima
das nossas criançasetrazer frutos paraofuturo

H


“Umbrinquedo
étambémum
ensinamentode
valoresdeconvivência”

LÁZARORAMOSÉATOR, APRESENTADOR, DIRETOR
EESCRITOR, CASADOCOMAATRIZTAÍS ARAUJO E
PAIDEJOÃOVICENTE,9ANOS,EMARIA ANTÔNIA,5
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