Exame - Portugal - Edição 440 (2020-12)

(Antfer) #1
DEZEMBRO 2020. EXAME. 27

unitivos dentro de uma organização” e defende
que “momentos fortes são momentos para se
criar uma cultura forte”.
A pandemia colocou desafios difíceis às
culturas e às lideranças empresariais. Maria
de Fátima Carioca mencionou um estudo feito
pela IESE em vários países sobre as emoções
das pessoas que foram forçadas a ficar em casa.
“Uns aceitaram, outros continuaram com uma
zanga interior devido à situação e houve quem
entrasse em depressão.” Num cenário deste
tipo, indica a dean da AESE, “a primeira coi-
sa que o líder tem de fazer é gerir todas essas
emoções que acabam por vir à tona e perceber
como é que, com uma equipa deslocalizada e virtual, se
consegue desenvolver coletivamente a cultura única e
a unidade entre pessoas relativamente dispersas”. Mas
isso apenas pode ser assegurado se já se tiver construído
uma base forte e uma liderança humilde nas organiza-
ções. “Não há milagres. Não é possível dizer ‘venham
agora para aqui uns consultores’, porque as pessoas es-
tão muito distantes”, realça Pedro Amorim. O managing

director da Experis Portugal esclarece que “os
que construíram equipas fortes e operam, com
integridade, as suas pessoas com culturas mui-
to orientadas para a transparência” têm mais
ferramentas para lidarem com estes desafios.
E é neste tipo de situações que vem ainda
mais ao de cima a diferença entre o chefe e o
líder, entre quem pensa ter todas as certezas e
quem se preocupa em saber formular as per-
guntas corretas. “Mostrar confiança não signi-
fica mostrar certeza”, explica Pedro Afonso. O
gestor especifica que “confiança e certeza são
coisas diferentes, e se eu tenho muitas certezas
é porque alguma coisa não está bem”. Apesar de
todas as exigências colocadas pela pandemia, Maria de
Fátima Carioca avisa que “o verdadeiro desafio começa
agora”. O mais provável é que se assista à implementa-
ção de modelos híbridos, com algumas pessoas a tra-
balhar de forma presencial e outras de forma remota,
e será necessário assegurar uma única equipa entre os
que estão perto e os que estão longe. A dean da AESE
conclui que “este modo híbrido é que é o desafio”. E

Empresas que
desenvolveram
culturas fortes
têm maior
probabilidade
de superar
os desafios
causados pela
pandemia

À PROCURA DO TALENTO ESCONDIDO


Juan Carlos Cubeiro, especialista em liderança e coaching, diz que todos
temos talento. O problema é que são poucos os que descobrem que o têm

Todos temos talento. O problema é descobri-lo. Esta foi uma das principais
mensagens deixadas por Juan Carlos Cubeiro, um dos maiores especi-
alistas ibéricos em liderança, na iniciativa o Futuro de Trabalho. “Todas as
pessoas têm talento, mas só poucas descobrem o talento que têm”, afirma
o também advisor do Human Age Institute, do Manpower Group.
Mas, afinal, como descobrir o talento? “Quando tens algo de que gostas,
que fazes bem, que o mercado considera e paga por isso, aí é talento”,
responde Juan Carlos Cubeiro, autor de cerca de cinco dezenas de livros
sobre liderança e coaching. O especialista, que aconselha algumas das
maiores empresas espanholas, especifica que “talento é pormos em valor
aquilo que sabemos, podemos e queremos fazer”, e realça que, “quando
nas empresas dizemos que as pessoas são o mais importante, isso não é
propriamente verdade. O talento é o mais importante”.
Segundo as estimativas de Juan Carlos Cubeiro, 40% das pessoas nunca
chegam a descobrir o seu talento. Isso pode ser explicado por fatores como
o tipo de sociedade em que vivemos, que valoriza principalmente o espetá-
culo e o show business. Outro entrave à descoberta de talento pode residir
na educação. Juan Carlos Cubeiro realça que, em Espanha, por exemplo,
a educação não aparece como uma das principais prioridades e preo-
cupações da opinião pública, e isso é um problema, já que “não pode
haver desenvolvimento do talento se não houver desenvolvimento
da educação”. O especialista defende que “o talento é capaci-
dade, compromisso e contexto” e que a escola tem de ajudar a
desenvolver esse tipo de competências.
Para encontrarem o talento, as pessoas têm mesmo de que-
rer fazê-lo, defende Juan Carlos Cubeiro. E querer é mesmo

querer e não apenas dizê-lo, sublinha. Enquanto muitas pessoas ainda não
descobriram o seu talento, os empregadores desesperam por encontrá-
-lo: em cerca de 40% das posições para as quais procuram candidatos, as
empresas acabam por não conseguir localizar aqueles que têm o talento
pretendido para as funções, observa o especialista. Na hora de contratar, as
empresas olham principalmente para as competências técnicas, a aptidão
e o conhecimento, mas isso não quer dizer que as soft skills não sejam
essenciais. No entanto, a regra, diz Juan Carlos Cubeiro, é que as empresas
“selecionam por aptidão e despedem pela atitude”.
Nas lideranças, competências como a autoconfiança, o autocontrolo, a ori-
entação para resultados, a empatia e a influência são ainda mais essenciais,
de forma a cultivar o talento coletivo.
A pandemia forçou muitas empresas a fazer em cinco meses uma transfor-
mação digital de cinco anos. Muitos trabalhadores tiveram de ficar em casa
em teletrabalho, e a forma como este desafio está a ser encarado pode
fazer a diferença entre o sucesso e o insucesso das organizações. “Com o
teletrabalho, muita gente tenta reproduzir a burocracia e o taylorismo. Mui-
tos ficaram 14 horas por dia à frente de um ecrã, o que não é produtivo”,
refere Juan Carlos Cubeiro. O autor ilustra com o caso de Espanha que,
tal como Portugal, é um dos países onde impera mais o “presencia-
lismo”. “Ficava-se até que o chefe fosse embora, porque o capataz
queria sentir-se capataz e ter todas as pessoas. Em algumas
empresas ainda se espera que, quando isto terminar, se
regresse a este modelo. Mas o capataz não tem de regressar.
Não aporta valor. Essa desconfiança, descontrolo e justifica-
ção da burocracia não fazem sentido”, considera o consultor.

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