DEZEMBRO 2020. EXAME. 31
ção desenhada pelas instituições públicas. Um trabalho
em conjunto. Tivemos oito mil pessoas interessadas, não
só jovens. Temos de ter a capacidade de desenhar pro-
gramas à medida em conjunto com as necessidades de
mercado. O UPSkill tem este desenho à medida, com o
compromisso das empresas tecnológicas para integra-
rem parte destas pessoas, com contrato sem termo e por
um valor mínimo tabelado. Isto também implica uma
revolução na formação que está a ser dada e no próprio
catálogo de qualificações.
Tem a sensação de que isto nos levou a fazer coisas
incríveis com grande rapidez?
Tenho a certeza. Passaram a fazer-se coisas que pareciam
impossíveis e de forma rápida. Também no setor privado.
A quantidade de empresas que passou a ter sistemas mis-
tos de trabalho, presencial e à distância. Diria que isto nos
mostrou que é possível fazer as coisas com foco e resulta-
dos rápidos, recentrando-nos no essencial.
O Estado quer influenciar as melhores práticas, mas
não pode correr o risco de ignorar modelos de que não
gosta. As empresas falam de flexibilida-
de. O segredo será uma conjugação entre
menor precariedade e mais flexibilidade?
O que procuramos todos é um modelo de
emprego sustentável, em que haja maior
corresponsabilização na relação laboral e a
preocupação de garantir a conciliação com a
vida pessoal, até porque, cada vez mais,
as empresas só vão conseguir fidelizar
os trabalhadores se eles se revirem
nelas. Têm de deixar o trabalhador
envolvido e comprometido. Por ou-
tro lado, é crítico ter um diálogo so-
cial eficaz, seja através do alarga-
mento dos modelos típicos de diálogo a outras
formas de relação laboral que estão hoje exclu-
ídas, seja na participação ativa nas empresas.
No final desta crise, a atividade sindical
pode sair enfraquecida porque, nestes mo-
delos remotos, há mais dificuldade para
as pessoas se organizarem. Essa é outra
das adaptações?
É evidente que a própria forma como a
representação coletiva é assegurada tem
necessidade de evoluir e de estar presente
nestas novas formas de trabalho. Temos de
conseguir que as novas relações laborais se-
jam representadas no diálogo social. O que
fizemos foi garantir que nos próximos dois
anos não há denúncia de contratação co-
letiva por caducidade, para garantir mais
estabilidade. Podemos pensar em incen-
tivos positivos. Pode ser uma forma de di-
namizar o diálogo social. Dou um exemplo concreto: estes
instrumentos de apoio à contratação podem estar associ-
ados à existência de contratação coletiva dinâmica, que
reflita a valorização que damos a um diálogo social eficaz.
Esta confirmação de que em muitos setores é possível
trabalhar sem estar no escritório pode ser uma opor-
tunidade para atrair trabalhadores de outros países?
Tínhamos desencadeado um estudo − um Livro Verde −
sobre o futuro do trabalho, exatamente para discutir as
mudanças que antecipamos e que implicam alguma re-
gulação. Muitas pessoas que trabalham em serviços públi-
cos de Lisboa podem viver no Interior e trabalhar remo-
tamente. Isso abre oportunidades, mas é preciso regular
para gerir equilíbrios. Isso foi evidente nas situações de
incerteza que surgiram. Em segundo lugar, isto abre no-
vas oportunidades extraordinárias de captação de talento
para Portugal. Os famosos nómadas digitais. Isso já está
a acontecer. Pessoas que olham para Portugal como um
país que, mesmo num contexto de pandemia, é um óti-
mo sítio para trabalhar remotamente. Não só estrangeiros,
mas portugueses que tinham emigrado. É um mundo de
oportunidades.
Embora o que estamos a viver seja a an-
títese do modelo “picar o ponto”, não se
pode cair na confusão total entre mundo
profissional e pessoal. Como se pode re-
gular, por exemplo, o horário de trabalho?
No momento de maior recurso ao teletra-
balho, tivemos várias situações que geraram
dúvidas e dificuldades: [quem paga] o com-
putador, o telemóvel, a cadeira, até o espaço.
Questões de conciliação da vida profissional
com a familiar, numa altura que coincidiu
com a suspensão das atividades letivas, e as
questões do horário de trabalho e do direito à desconexão.
São estas as áreas críticas a regular. Diferente é o traba-
lho nas plataformas digitais: é preciso regulação. Iden-
tificámos essas áreas no Livro Verde para procurar uma
resposta estável.
No final desta crise, podemos ter trabalhadores bas-
tante bem e outros em situação de grande dificuldade?
A evolução que tivemos foi de aumento dos salários, basta
pensar no salário mínimo. O nosso objetivo é manter a va-
lorização do SMN. Por outro lado, aumentámos o valor de
entrada nos estágios do IEFP e fizemos uma majoração da
contratação sem termo. Por outro lado, a preocupação é a
qualificação. É a palavra-chave. Apostar nas qualificações
é fazer a diferença na oportunidade de as pessoas serem
valorizadas e mais bem pagas. Esse é o verdadeiro instru-
mento de combate à pobreza. É aí que temos de colocar
toda a nossa energia para garantir que damos igualdade
de oportunidade às pessoas para serem valorizadas no
mercado de trabalho. E
Isto abre novas
oportunidades
de captação
de talento para
Portugal, não
só estrangeiros,
mas também
portugueses que
tinham emigrado
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