O Tempo (2020-12-02)

(Antfer) #1
Pirapora construiu
sua história ligada
intimamente ao rio
São Francisco

PiraporaPirapora


Relação estreita.
É das águas
que moradores
tiram o sustento
e também suas
crenças

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sobre o Norte e o Vale
do Jequitinhonha

Capítulos 5 e 6: Norte de Minas e Vale do JequitinhonhaCapítulos 5 e 6: Norte de Minas e Vale do Jequitinhonha


Na baixa estatura, o pescador
Reinaldo Alves dos Santos, 63, es-
conde praticamente uma vida in-
teira de forte relação com o rio
São Francisco. E, por onde passa,

Muranga, como é popularmente
conhecido em toda a Pirapora, no
Norte de Minas, deixa os seus
“causos” sobre o Velho Chico. “A
gente que é pescador conta histó-
ria verdadeira, daquilo que acon-
teceu no rio. Quem não conhece e
não sabe o que é uma pescaria
tem que navegar nele à noite. O
que tem de cabeça em cima da
água tem de olho embaixo”, diz.
Muranga garante que é tudo

verídico. “O trem que eu mais de-
testo na minha vida é homem
mentiroso”, acrescenta. Sempre
rodeado por amigos, o pescador
mora em um barco improvisado
às margens do São Francisco com
a mulher. E do rio sempre saiu o
sustento para toda a família. “Não
é mais tão bom como antigamen-
te, quando havia mais peixe,
água, o rio era mais fundo. Isso
aconteceu porque as margens fo-

ram muito desmatadas. Se não
preservar, daqui a 60 anos vai ser
só um rego d’água”, teme.
O pescador conta que já pegou
surubim de 97 kg e lutou com sucu-
ri. Ele jura também que viu o cabo-
clo-d’água, criatura que vira e afun-
da barcos. “Eram dois ‘cumpades’
d’água. Pedi para eles soltarem
que no outro dia levaria pinga e fu-
mo”, descreveu. Muranga diz que
cumpriu com afinco a promessa.

Memórias da navegação


A paixão pelo Benjamin e pelas histórias do porto


Casarões antigos respiram música


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Da parte baixa
do relevo, uma
imensidão de monta-
nhas de pedra e vege-
tação característica
do Cerrado é vista de
longe no horizonte.
Mas bastam alguns minutos pa-
ra a paisagem da estrada mudar
drasticamente: aproxima-se a
singular região de onde saíram
os diamantes que ajudaram a
enriquecer ainda mais a Coroa
Portuguesa. É a serra dos Cris-
tais, que cria uma verdadeira
moldura para a icônica Diaman-
tina, no Vale do Jequitinhonha.

Entre a herança barroca, a músi-
ca se fez legado e presente com
uma das manifestações culturais
mais importantes da cidade: a ves-
perata. Das sacadas, os concertos
de solistas têm uma acústica pecu-
liar e própria de Diamantina. To-
dos os anos, são pelo menos 18
apresentações, sendo três gratui-
tas, nos períodos de estiagem, en-
tre abril e outubro. “Normalmente,
aqui se encontra música em todos
os lugares. A cada pedaço que você
caminha, é como se estivesse vol-
tando a um período da história”, re-
sume a diretora do Museu do Dia-
mante, Sandra Martins Farias.

Residência onde
a Chica da Silva
viveu em Diaman-
tina, entre
1763 e 1771

0 JK. Juscelino Kubitschek
nasceu em Diamantina. A
casa onde ele viveu na
infância virou museu.

0 Chica. Mesmo com todo
preconceito, Francisca da Silva
de Oliveira, a Chica da Silva
(foto), mulher negra e
escravizada, se tornou uma das
figuras mais fortes de
Diamantina. O principal legado
deixado por ela, além do poder
feminino para mudar o rumo da
história, foi o incentivo às artes.

WIKIMEDIA COMMONS

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Quando o rio era a única “ro-
dovia” que existia para o
Norte e o Nordeste do país, na se-
gunda metade do século XX, o por-
to de Pirapora, no Norte de Mi-
nas, recebeu milhares de pessoas
à procura de melhores condições
de vida. No auge da navegação
dos barcos a vapor, a cidade con-
tou com 34 embarcações, cada
uma de um porte diferente.
Outro meio de transporte no
município era o trem, que levava
passageiros para Belo Horizonte,
Rio de Janeiro e São Paulo. “En-

quanto uns chegavam, outros par-
tiam. Era movimento de segunda
a segunda”, conta o diretor de Pa-
trimônio Imaterial e Histórico do
município, Adélio Brasil.
De toda a memória dos tempos
áureos da navegação, um vapor se
tornou ícone de Pirapora: o Benja-
min Guimarães, o único movido a
lenha ainda em funcionamento no
mundo. Retirada das águas no iní-
cio de novembro, a embarcação se-
rá restaurada para voltar com os
passeios e preservar essa memória
para as futuras gerações.

Benjamin
Guimarães
é o maior
patrimônio
de Pirapora

Imponência.
Montanhas de
pedra formam a
paisagem a caminho
do Vale do
Jequitinhonha

DiamantinaDiamantina Micael Ferreira, 18,
e Kaio Tolentino,
17, tocam na
vesperata
em Diamantina

“O vapor


Benjamin


Guimarães,/


para a nossa


população,/


representa


muito mais/


do que uma


simples


embarcação./


Para nós é


sentimento,/


de puro


pertencimento,


/ é sangue, é


coração.


Cordel de
Israel Pereira
Mourão, recitado por
sua filha Elaine
Ramos Mourão

Personalidades


As tradiçõesAs tradições que que


vêm do Velho Chicovêm do Velho Chico


CONTEÚDO ESPECIAL O TEMPOBELO HORIZONTE| QUARTA-FEIRA, 2 DE DEZEMBRO DE 2020 | 11

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