O Tempo (2020-12-02)

(Antfer) #1
Atualmente, de cada cin-
co chefes de família valada-
renses, pelo menos quatro
têm ou já tiveram algum pa-
rente vivendo no exterior.
Um fenômeno que começou
com um grupo de alunos de
uma escola de inglês funda-
da em Governador Valada-
res, na região do Rio Doce,
em 1964. Mas, muito mais
que a busca pelo sonho ame-
ricano, a cidade descobriu a
vocação de suas riquezas na-
turais e se projeta como capi-
tal mundial do voo livre.
Tudo graças ao pico da
Ibituruna, elevação rochosa
de quase mil metros de altura em re-
lação ao rio Doce, vista de qualquer
ponto da cidade. “Valadares não
tem vento, e isso propicia ao piloto
grandes voos. Não tanto de distân-
cia, mas conseguimos ir e voltar pa-
ra o mesmo lugar, voar em várias di-
reções”, enfatiza Ederson Souza Du-
tra, 39, membro da Associação Vala-
darense de Voo Livre.
Desde 1990 a região recebe cam-
peonatos nacionais e até internacio-
nais e hoje briga para sediar a próxi-
ma Copa do Mundo do esporte. O
sucesso é tanto que a prática desper-
ta também as novas gerações, como
o piloto Eros Milholo, 19, que, ape-
sar da pouca idade, já acumula oito
anos de experiência nos saltos e até
conduziu a reportagem em um voo
duplo. “Meu pai me levou para voar
aos 4 anos. Desde então me apaixo-
nei pelo esporte. O voo livre é minha
vida inteira”, define.

Capítulo 9: Rio DoceCapítulo 9: Rio Doce


Além de polo de ‘exportação’ de imigrantes,
a cidade coleciona um passado rico e se
projeta como capital mundial do voo livre

Salto. Eros Milholo
e o repórter Lucas
Morais no voo do
pico da Ibituruna.
“Melhor sensação
que já tive”,
diz Lucas.

‘Não tem como


falar da cidade


sem falar do rio’


¬Margeada pelo rio Doce,
Governador Valadares cresceu
e se conectou ao leito. E há cin-
co anos sofre com a destruição
causada pelo desastre da mine-
ração em Mariana, na região
Central de Minas.
“Não tem como falar de Va-
ladares sem mencionar o rio. A
tragédia prejudicou desde o
agricultor até as famílias que
faziam sua moqueca de cascu-
do aos sábados”, diz o historia-
dor Haruf Espindola.

A cultura
da migração é
extremamente
perversa,
principalmente para os
jovens, é uma
supervalorização daquilo que
vem de fora. As fotografias sempre
mostram a beleza da neve, nunca a
dor que é trabalhar na neve.

Sueli Siqueira, cientista social e professora da
Universidade Vale do Rio Doce

0 Zona rural.Zona rural. É no distrito de É no distrito de
Ipaneminha, a 20 km de Ipatinga, que Ipaneminha, a 20 km de Ipatinga, que
uma riqueza cultural enche os olhos pela uma riqueza cultural enche os olhos pela
bravura das pessoas que tentam mantê-la bravura das pessoas que tentam mantê-la
de pé: o congado.de pé: o congado.

0 Religiosidade.Religiosidade. Todos os anos, em Todos os anos, em
agosto, os congadeiros tocam agosto, os congadeiros tocam
instrumentos e músicas de louvor na instrumentos e músicas de louvor na
igreja da comunidade, além de levantar a igreja da comunidade, além de levantar a
bandeira para Nossa Senhora do Rosário. bandeira para Nossa Senhora do Rosário.
“Peço graça e bênção e recebo”, diz a “Peço graça e bênção e recebo”, diz a
aposentada Creuza Claudina Rosa de aposentada Creuza Claudina Rosa de
Oliveira, 66.Oliveira, 66.

Aproxime a
câmera do
celular para ver
o vídeo sobre
Governador
Valadares e
Ipatinga.

Passado rico


Governador ValadaresGovernador Valadares


Vocação para


o aço faz surgir


cidade-modelo


7


A mesma BR–381 que leva à região
do Rio Doce passa pelo Vale do Aço.
Em 1958, a então vila de Ipatinga foi esco-
lhida pelo presidente Juscelino Kubitschek
para abrigar a maior siderúrgica do país, a
Usiminas. Cerca de 20 mil trabalhadores fo-
ram levados ao local para colocar a usina
de pé. Foi quando uma nova infraestrutura
também começou a ser erguida.
Em pouco tempo, a cidade que deu ori-
gem ao Vale do Aço ganhou avenidas lar-
gas, parques, ciclovias e toda uma urbani-
zação típica dos grandes centros, mas
com muito verde. E também passou a
mesclar culturas do Japão, Alemanha, Itá-
lia e Grécia por conta dos técnicos convi-
dados para trabalhar no projeto. “Essa
miscigenação ajudou muito no crescimen-
to de Ipatinga e no que ela é hoje”,conta o
historiador José Augusto de Moraes.

Tradição do congadoTradição do congado


Expansão veio


de vias, guerra


e indústria


7


Foi em 1910, com a che-
gada da estrada de ferro,
que o desenvolvimento che-
gou com força à região do Rio
Doce. “A grande expansão
veio em função da guerra, com
os acordos assinados pelo Bra-
sil com Estados Unidos e Ingla-
terra, que possibilitaram o sa-
neamento dessa região, com-
bate à malária. E também foi
inaugurada a rodovia Rio-Ba-
hia”, conta o historiador Haruf
Salmen Espindola, da Universi-
dade Vale do Rio Doce.
A Companhia Açucareira
(foto), que atuou até 1976 em
Governador Valadares, exer-
ceu um papel fundamental pa-
ra esse boom econômico. “Foi
um elemento dinamizador da
economia da cidade, de cresci-
mento”, conclui Espindola.

IpatingaIpatinga


Muito além de Muito além de


um sonhoum sonho (^)
americanoamericano
Creuza Claudina,
66, e José Marciano,
86, participam do
congado desde a
infância
16 | O TEMPOBELO HORIZONTE|QUARTA-FEIRA, 2 DE DEZEMBRO DE 2020 CONTEÚDO ESPECIAL

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