Revista Literária Prosa & Versos

(Anita Santana) #1
Revista Literária Prosa & Versos

uma longa trilha de algo que parecia uma se-
creção brilhante propiciava o deslizar. A face,
mesmo tendo alguns contornos humanos,
com uma boca mirrada e olhos demasiada-
mente grandes. Uma fina e espalhada cama-
da de pelos cobria todo o dorso da criatura
e, quando se rastejou à minha frente, pude
verificar que haviam duas pequenas asas.


— Não se espante comigo. Tenha cer-
teza que eu seria o ser menos estranho que
você virá nesta noite — disse-me a criatura
diante do claro espanto que o meu rosto re-
velava.


— Desculpe. Não quis ser ofensiva! —
Respondi, tentando desfazer toda a primeira
impressão. Tudo era muito estranho e a rea-
lidade parecia ter se perdido naquele lugar.
Continuei a falar: — Quem é você? Onde fica
este lugar.


A criatura, com um sorriso cínico no
rosto, disse que se chamava Albion e que
também não sabia onde ficava aquele lugar.
Só sabia que estava ali há muito. Com um
convite, a criatura me convidou a segui-la
em direção ao local do encontro daquela noi-
te e, segundo ele, onde poderia colher mais
informações sobre o motivo da minha chega-
da naquelas terras. Mesmo que o espanto to-
masse forma em meu rosto, não poderia re-
cusar o convite. Parecia que não havia outra
criatura naquele local e temi encontrar algo
ainda mais estranho do que Albion. Cami-
nhamos pouco mais de dez minutos em com-
pleto silêncio até que, não mais suportando,
resolvi perguntar:


— Estamos indo para qual lugar?
— Pois bem, minha jovem, caminha-
mos em direção à Colina dos Gatos, um local
sagrado nestas terras.


— Por qual motivo?
— Lá estão os fiéis protetores de meu
senhor, uma dúzia de gatos de Saturno e,
hoje, será o dia de sacrificar a eles algumas
oferendas.


A mansidão nas palavras de Albion fa-

zia o coração de Berenice disparar em medo.
Uma onda de arrepio tomou conta de seu
corpo enquanto uma rajada uivante e fria so-
prava de modo instintivo.
— E como são estes animais?
— Bem, eu te disse que não era a cria-
tura mais estranha que você veria. Os gatos
de saturno são muito bonitos. Com grandes
olhos coloridos que saltam das faces e con-
trastam com uma pelagem psicodélica. A
cauda é semelhante a um chicote que pos-
sui um gancho na ponta, com a qual atacam
seus oponentes. São criaturas infernalmente
amáveis, apesar de letais.
— E quem são os sacrifícios?
— Apenas alguns prisioneiros de guer-
ra. Eles preferem a morte a continuar sendo
torturados nas masmorras que ficam na re-
gião do pântano de Trophillos.
Depois de cerca de meia hora, enfim,
alcançamos a Colina dos Gatos. Uma esca-
daria de pedras levava até o cume do peque-
no monte. Mesmo com a respiração ofegante,
subi em passos lentos e consegui chegar até
o lugar preparado. Uma dúzia das estranhas
criaturas estavam a cruzar de um lado para o
outro. Por todo o recinto, alguns seres muito
estranhos e que pareciam ter saído do mun-
do dos sonhos estavam a preencher o espa-
ço. Alguns com tentáculos, outros com mui-
tos olhos; outros, ainda, que pareciam nem
mesmo ter cabeça. No meio do recinto, em
um trono prateado, uma criatura estranha
e que parecia ter um grande par de chifres
brotando de sua fronte olhava a tudo.
A jovem viu algumas figuras huma-
noides prostradas diante de cálices dou-
rados e ouviu quando uma voz estridente
começou um discurso. Uma a uma, as figu-
ras humanoides tiveram as gargantas cor-
tadas enquanto os seus sangues enchiam
os recipientes. Berenice tentou ainda esbo-
çar uma reação, diante de tudo que estava
vendo, contudo, o olhar de Albion fora cla-
ro e orientava para que ela não se movesse
nem falasse nada. Novamente, a sensação
Free download pdf