marighella

(Ornilo Alves da Costa Jr) #1
218 CARLOS, A FACE OCULTA DE MARIGHELLA

ele ficou muito atarefado, mas no seu dia a dia como ele estava, no
geral, como ele se comportava?
Clara – É muito difícil você dar essa resposta assim. É muito
simples a sua pergunta, simplista. Você imagina, uma pessoa que
toma a decisão que ele tomou, quando ele achou que a linha do Par-
tido Comunista não propunha resistência contra a ditadura militar,
você há de convir que foi um processo muito delicado, muito difícil.
Basta ver a carta que ele escreveu à Executiva do Partido quando
ele se desliga do Partido dizendo que não havia para ele nenhuma
questão de ordem pessoal nessa saída do Partido, mas era porque ele
não poderia conviver com procedimentos que ele achava que não
eram revolucionários e a situação exigia comportamento de caráter
revolucionário. Você há de convir que isso teve muita influência na
decisão dele, no comportamento. Não é que de repente ele fechou a
cara e antes vivia rindo. Depende da circunstância, a pessoa porque
está numa luta muito difícil não deixa de rir, conforme o momento.
O problema é que era uma decisão muito grave, ele tomou com muita
consciência essa decisão, não tomou uma decisão quando ele tinha 18
anos, já tinha mais de 50 anos de idade, um homem absolutamente
maduro e quando se encontravam esgotadas todas as possibilidades
de reação diante do quadro que vivia a nação naquele momento. Ele
era bem humorado – como eu disse antes – de personalidade bem
humorada, brincava, fazia piada. Você há de convir que isso não po-
dia ser o dia inteiro, nem todas as 24 horas do dia. Depois, cada vez
que havia uma ação, uma reação, ou cada vez que havia um acidente
com alguém ou alguém era assassinado, quando ele sabia que alguém
era torturado, como que ele ia ficar? Ele sofria muito com tudo isso.
Exatamente por essa sensibilidade que ele tinha, ele sofria muito. Só
que isso não fazia com que ele desistisse da luta, porque ele achava
que a luta envolvia tudo isso. A luta não era brincadeira, era muito
séria. E que implicava em perigos, riscos de vida, decisão, enfrenta-
mento. Lógico que se ele pudesse ter feito a luta e ter sobrevivido, e

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