marighella

(Ornilo Alves da Costa Jr) #1
254 CARLOS, A FACE OCULTA DE MARIGHELLA

Carlos – 1964. Então meu pai ia à escola. Me lembro que ele
chegava lá com uma peruca, ele ficou muito estranho, ele cortava o
cabelo retinho, ele raspava com uma navalha, e só ficava uma mecha
de cabelo em cima. Então, ele chegava lá cabeludo, como se fosse o
nosso cabelo mesmo, meu cabelo quando cresce fica igual ao dele,
meio black power. Ele andava de calça jeans, que era uma roupa de
gente jovem, de roqueiro, de playboy, naquela época. Calça jeans, blu-
são jeans, e aquela cabeleira, parecia um motoqueiro, era outra pessoa.
Mas ele ia na escola me visitar, entrava na escola e ia falar comigo.


Edson – Na escola, você teve algum problema com o sobrenome
Marighella?
Carlos – Eu fui expulso da escola, expulso com solenidade, o
diretor, que era um militar, reuniu todos os estudantes e disse que
ali não podia estudar o filho de um comunista.


Edson – Isso na frente de todo mundo?
Carlos – Todo mundo. Eu tinha 15 anos.

Edson – O que você entendia desses acontecimentos?
Carlos – Eu não conseguia entender direito, fiquei muito trau-
matizado até, não imaginei que uma pessoa pudesse fazer isso. Na
verdade era uma coisa que me atingia cruelmente, a desmoralização
na frente de meus colegas, dos meus amigos, e o que é pior, a escola
estava paga, internato, quer dizer tinha comida, tinha dormida, estava
com minha vida garantida, a escola era um ponto absolutamente
seguro, era uma casa, eu não precisava sair da escola. Lá eu comia e
dormia. Então me expulsar da escola acabou com minha estrutura
pessoal. Eu tive que voltar para a Bahia por causa disso, até então
não havia passado isso pela minha cabeça. Quando meu pai foi
preso finalmente e eu expulso da escola, minha mãe foi pra lá e me
trouxe para a Bahia.

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