marighella

(Ornilo Alves da Costa Jr) #1
90 CARLOS, A FACE OCULTA DE MARIGHELLA

problema algum, era só retirar os móveis, deixar temporariamente
num depósito, depois seria encaminhado ao seu destino final. Isso
funcionaria para ludibriar a polícia.^127 Esse é outro exemplo que serve
para a dimensão humana de Marighella. Acima das questões envol-
vendo o Partido e o momento duro da clandestinidade, a prioridade
era resolver primeiro essa questão pessoal. Marighella certamente teria
motivos de sobra para não se envolver em questões pessoais de outros
militantes, mas sabia que a luta política exige sacrifícios muitas vezes
ignorados pela insensibilidade das pessoas. Além de recusar a empáfia
de personalidade, Marighella também tinha o hábito de tornar a
militância menos superficial e mais solidária.
Geraldo Rodrigues dos Santos, o Geraldão, como era conhecido,
filiou-se ao Partido Comunista em maio de 1945, após ser demitido
da Companhia das Docas de Santos, uma empresa que explorava
o porto. Atuava no sindicato dos portuários e vinha se destacando
em sua atividade. Conheceu Marighella em 1945, mas só estreitou
esse contato cinco anos mais tarde. Marighella atuava na direção
estadual do Partido em São Paulo. Em 1950, Ramiro Luchese, di-
rigente ferroviário, manteve contato com Geraldão, em Santos. O
contato inicial se resumia ao convite a Geraldão para ser militante
revolucionário. Ele alega que não compreendia muito essa ideia de ser
revolucionário profissional, o que sabia era que vinha trabalhando a
vida toda. Geraldão acabaria por integrar a Sessão Sindical do Comitê
Estadual do PC, em São Paulo. A empatia com Marighella surgiu
logo no primeiro contato. Geraldo qualifica essa empatia pelo fato
de Marighella tê-lo deixado à vontade. Em contrapartida, a maioria
dos dirigentes do Partido só tratavam das questões do Partido, não se
conversava sobre outras questões. Geraldo foi membro da Executiva
do PC por mais de dez anos, hoje é integrante do Partido Popular
Socialista (PPS). Dos diálogos que teve com Prestes, nada estava


(^127) Cf. depoimento de Clara Charf.

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