National Geographic - Portugal (2021-02)

(Antfer) #1
A VESPA-ASIÁTICA 93

Para a Vespa velutina, as abelhas-melíferas,
domesticadas há séculos e omnipresentes na
Península Ibérica, são como as ovelhas para os
mamíferos predadores: saborosas e desajeitadas.
Costumam atacá-las quando regressam do campo
carregadas de néctar e pólen. Nesse momento são
a presa ideal: as vespas-asiáticas caçam-nas e, se-
gurando-se num ramo, desfazem-nas até ficarem
com a parte mais nutritiva, o tórax, que trituram
para as larvas ávidas. “O pânico destes ataques
leva as abelhas a deixarem de sair e a optarem por
se alimentar das reservas. No entanto, se isso se
prolongar demasiado, quando o Inverno chegar
não terão despensa e morrerão”, explica Narcís Vi-
cens, técnico ambiental de Girona, em Espanha.
Não é curiosamente o caso de uma das abelhas
melíferas da Ásia, a Apis cerana, que sabe defen-
der-se destes ferozes himenópteros. Quando uma
vespa se aproxima da colmeia da Apis cerana, as
abelhas formam um grupo muito compacto à sua
volta e batem as asas até aumentarem a tempe-
ratura no interior dessa massa viva: uma bola de
calor que alcança 45°C, a temperatura máxima su-
portada pela Vespa velutina, que acaba por morrer.

PARA ENFRENTAR O PROBLEMA causado pela
Vespa velutina, as autoridades dos países afectados
prepararam conferências e panfletos para divulga-
ção, alertaram as populações, colaboraram com
investigadores para proteger as colmeias (utili-
zando redes e harpas eléctricas que dificultam a
entrada destas vespas nas colmeias). O Serviço de
Protecção da Natureza e do Ambiente da Guarda
Nacional Republicana (SEPNA-GNR), as juntas de
freguesia e o Instituto da Conservação da Natureza
e das Florestas têm registado um número crescente
de avistamentos de vespeiros em Portugal. A popu-
lação tem sido alertada para não se aproximar
delas. “As vespas-asiáticas têm um comportamento
mais defensivo e protector das colónias do que as
nossas vespas. Surgem mais animais a defender o

vespeiro e reagem de forma mais rápida ao que
entendem como ameaça, aumentando a probabi-
lidade de picadas”, diz o entomólogo português.
O ciclo de vida da espécie tem sido abundante-
mente descrito em França, mas existem diferenças
significativas face ao que sucede em Portugal, sobre-
tudo porque um Inverno menos rigoroso pode não
matar todas as obreiras da colónia, permitindo que
o vespeiro permaneça activo até à Primavera
seguinte. “Mas os vespeiros nunca arrancam para
um segundo ano de vida”, esclarece Grosso-Silva.
Investigadores da Universidade de Alcalá, lide-
rados pelo ecologista Salvador Rebollo, estudam,
na Galiza, o potencial de uma ave de rapina: o bú-
tio-vespeiro, um dos poucos predadores naturais
dos ninhos de vespas na Península Ibérica. “Até
2012, ano em que a vespa-asiática apareceu na Ga-
liza, a população reprodutora do bútio-vespeiro
na nossa área de estudo, as rias Baixas, era espo-
rádica. Contudo, segundo os nossos dados, mul-
tiplicou-se por dois ou três desde a chegada deste
insecto”, explica. Os seus resultados provêm da
análise dos restos de presas e fragmentos de favos
de vespeiros localizados no ninho e imediações, e
da análise do registo fotográfico das câmaras ins-
taladas. “Em todos os ninhos de bútio-vespeiro
estudados, apareceram restos de vespa-asiática,
o que demonstra que é uma parte importante da
dieta desta ave de rapina e poderá ser um potente
aliado no controlo biológico da velutina”, conclui.
Armadilhas, inserção de biocidas com drones ou
armas, injecção de ar quente, predação e controlo
biológico, destruição de ninhos, equipamentos de-
fensivos para colmeias... São muitos os métodos
testados para lutar contra a vespa, mas é consen-
sual que esta espécie veio para ficar. Os especia-
listas sublinham que a gestão desta invasora deve
ser acompanhada de medidas que permitam uma
regulação das colmeias. Catalogadas como gado,
as abelhas melíferas são criadas aos milhões e são
tantas que roubam o lugar às restantes abelhas (da-
dos recentes apontam para a existência de 1.097 es-
pécies diferentes na fauna ibero-balear) e aos ou-
tros polinizadores silvestres, sobre os quais não se
fala. Os planos implementados para a vespa-asiá-
tica e para as abelhas melíferas deverão ter igual-
mente em conta estas importantes espécies. j

A vespa-asiática invadiu o nosso território da mesma maneira


que algumas vespas europeias colonizaram outros continentes.


Um investigador segura um vespeiro
de Vespa velutina no Instituto de Investigação
de Biologia de Insectos (IRBio), em França.
Estes ninhos podem atingir 80 centímetros de
diâmetro e um metro de altura.

AFP/GETTY IMAGES

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