Os rios e lagos alimentados pelas chuvas, ou-
trora responsáveis pelo sustento de numerosas
gerações de pastores, desapareceram. Em 2016,
os poços da aldeia de Haya secaram pela segun-
da vez em cinco anos.
A aldeia alugou camiões para trazerem água
de outra cidade, mas “sentíamo-nos sedentos”,
diz Raxma. Os aldeãos não lavavam a roupa.
E, ao contrário do que sucedera no ano de abun-
dância em que Raxma nasceu, não deram nomes
aos anos maus, na esperança de que esses tempos
fossem esquecidos. “Antigamente, vendíamos ca-
bras e tínhamos carne e manteiga. Não precisáva-
mos da ajuda de ninguém. Costumávamos ajudar
os outros porque tínhamos bens a mais.”
Os pastores somalis não medem a riqueza em
função do que conseguem comprar, mas pela di-
mensão dos rebanhos. A perda de animais equi-
vale a perder a casa, ver o automóvel roubado e a
conta bancária esvaziada – tudo num só dia.
Em Haya, o fedor da morte causado por milha-
res de carcaças de animais a apodrecer pairava
no ar, mas a família de Raxma conseguiu resistir
durante três meses, enquanto a seca de 2016 se
agravava. As famílias com camelos sobreviventes
partilharam o leite com aquelas cujos rebanhos ti-
nham perecido. À medida que a comida escassea-
va, os adultos reservaram as porções maiores para
as crianças mais novas. A diarreia generalizou-se,
conta Raxma, e temeu-se pela vida. Quando os
animais morreram todos, os aldeãos reuniram o
dinheiro disponível e alugaram um camião para
serem conduzidos a um campo de PDI (pessoas
deslocadas internamente) perto de Burco, na re-
gião central da Somalilândia.
Segundo estimativas do Banco Mundial, 143
milhões de habitantes da África Subsaariana, da
Ásia do Sul e da América Latina serão obrigados a
mudar-se dentro dos seus próprios países devido
às alterações climáticas até 2050.