Elle - Portugal (2021-03)

(Antfer) #1

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INSPIRAÇÃO


um espaço público. No entanto, porque o mundo não vê as
coisas dessa forma, já foi levado várias vezes a tribunal por
uma suposta censura de conteúdo aparentemente legal. No
ano passado, o canal de direita PragerU evocou a Primeira
Emenda da Constituição dos Estados Unidos, afirmando que
o YouTube infringiu os seus direitos ao “censurar” as suas
opiniões conservadoras. Neste caso marcante, que poderia ter
implicações mais amplas para argumentos de liberdade de
expressão online, o tribunal americano decidiu que, apesar
da “omnipresença” do YouTube, este é, de facto, um fórum
privado, não um fórum público.
«É uma área complexa tanto do ponto de vista social como
de “engenharia”. Temos de ser nós a criar as políticas [de
conteúdo]», diz Cécile, referindo-se à posição da empresa
sobre o que constitui conteúdo nocivo.«Mas demora entre
quatro a cinco meses a criar uma nova política, porque uma
das coisas que não queremos fazer é tomar decisões apres-
sadas. E a própria política também tem que estar sempre
a mudar. Temos que criar um modelo para que possamos
treinar verificadores humanos numa série de diferentes
idiomas para que possa ser aplicada a nível global».
No segundo trimestre de 2020 removeram 11 milhões de
vídeos que violavam as políticas de conteúdo do YouTube.
«E 52% nunca tinham sido vistos! Portanto, as “máquinas”
estão a fazer um bom trabalho. A execução é muito boa,
mas não é perfeita», admite. Um exemplo disso é a cruz
suástica: a tecnologia tem dificuldade em entender se é o
emblema nazi ou o símbolo budista do “nó interminável”.
«A questão é: onde é que se estabelece o limite? É fácil
quando o conteúdo é ilegal. Quando não o é, existem apenas
opiniões diferentes. Não queremos chegar a um ponto em
que estamos a censurar, a linha é ténue...», esclarece.
Enquanto Cécile fala, torna-se evidente que uma plata-
forma que começou como um site de encontros em vídeo
(o primeiro upload do YouTube foi do co-fundador Jawed
Karim, no jardim zoológico de San Diego, a falar sobre
como os elefantes são giros, numa tentativa, imagine-se, de
mostrar o seu lado sensível ao público feminino) tornou-se
um labirinto moral de linhas ténues e zonas cinzentas. O
YouTube tem agora mais de dois mil milhões de utiliza-
dores por mês, principalmente na faixa etária dos 18 aos
34 anos, embora se verifique um acelerado aumento do
público mais velho. Informa o mundo de tudo, desde como
aplicar iluminador até às últimas atualizações de saúde
da Covid-19. Pense nele como uma junção do New York
Times com a DGS, com todos os canais de entretenimento

sabe, esse grupo inclui grandes marcas como a Fox Media
(para quem a Fremantle criou programas como o American
Idol) e criadores independentes como Ryan Kaji, um rapaz de
nove anos do Texas que começou a sua carreira a experimentar
brinquedos e que agora tem um canal no YouTube chamado
Ryan’s World, com 28.1 milhões de subscritores (em 2019,
Kaji foi eleito como a pessoa mais bem paga do Youtube,
com uma receita de 26 milhões de dólares).
O YouTube paga «provavelmente o equivalente ao orça-
mento de programação de um canal de televisão generalista»
aos seus criadores, afirma Cécile. Isso significa que parte do
seu trabalho é garantir que há um fluxo saudável de novos
produtos para ajudar a maximizar os negócios dos criadores
do YouTube. Mas também existem parceiros editoriais e
musicais (mais de dois mil milhões de utilizadores registados
assistem a um videoclipe por mês). E depois, como é claro,
existe o lado mais complicado da moderação do negócio, no
qual a plataforma se encontra ciclicamente dentro e fora de
perigo. O YouTube é uma plataforma livre, o que determina,
obviamente, tanto a sua beleza como o seu desafio. Quando o
mundo está a fazer uploads de vídeos de golden retrievers, tudo
bem. Mas quando está a fazer outros uploads, é outra história.

«O YOUTUBE VAI SER SEMPRE UMA PLATAFORMA LIVRE,
mas, dentro disso, temos a responsabilidade de garantir que
o conteúdo não seja prejudicial para os nossos utilizadores.
É aí que entra a moderação», diz Cécile, acrescentando que,
neste momento, uma das maiores áreas de investimento para
a empresa é precisamente a moderação – tanto automática
como humana. «O nosso papel não é supervisionar, mas
precisamos de sistemas para garantir que removemos o que
é nocivo e que não recomendamos nada que – embora até
possa não violar as nossas políticas – acreditamos não ser
uma experiência de qualidade». É complicado, porque a
ideiadeconteúdoofensivo para uma pessoa é o direito legal
deoutra se expressar numa plataforma pública. O ponto
crucialaquié que o YouTube é uma empresa privada, não

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