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Banco Central do Brasil

Revista Época/Nacional - Vivi para contar
sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021
Cenário Político-Econômico - Colunistas

hora da reprodução das fantasias em larga escala. Para
dar conta do recado, arregimentava mais oito a nove
costureiras. Em 2020, com os trabalhos rarefeitos, a
chefe da família de uma casa com um filho de 21 anos e
um neto de um 1 ano e meio ficou três meses sem
pagar o aluguel.


Santos, contudo, pode considerar que tem sorte, porque
a agremiação para a qual presta seu principal serviço, a
Viradouro, atual campeã do Carnaval, foi a primeira a
retomar os trabalhos na Cidade do Samba, ainda no fim
do ano passado. E, até quando os barracões foram
interditados a pedido do Ministério Público do Rio
(MPRJ), devido ao risco de incêndios, a escola manteve
as atividades num ateliê da Zona Portuária. É onde está
Santos, prestes a concluir os protótipos para um
possível desfile em 2022 — que abordará a esfuziante
folia de 1919, pós-gripe espanhola.


“Mesmo com uma equipe reduzida, fomos acolhidos
pela Viradouro, que não nos abandonou. Mas não
chega à metade do volume de trabalho que eu
costumava ter. E é triste para mim falar sobre as outras
costureiras. Algumas estão vendendo quentinha,
fazendo faxina, produzindo máscaras... Muitas estão
sem qualquer perspectiva. Por isso, só quero que este
ano passe logo”, disse Santos.


Mesmo se a vacinação contra o coronavírus avançar e
os barracões reabrirem nos próximos meses, o diretor
de Carnaval Junior Schall acredita que as escolas já
terão perdido muitos de seus profissionais e artistas.
Diante da insegurança do mercado da folia, a tendência
de muitos é procurar um emprego menos instável. Se
dependesse de sua mulher, a microempreendedora
Michelle, ele próprio não voltaria às escolas de samba.


Quando o efeito dominó da pandemia chegou às


agremiações, foi o pequeno negócio de refeições fitness
de Michelle que garantiu o sustento. Schall, com 25
anos de experiência e campeão da Sapucaí num dos
cargos mais exigidos para a nota 10 — uma espécie de
diretor de logística —, assumiu as entregas das
marmitas produzidas pela mulher. Mais recentemente,
ficou à frente do ponto de venda da microempresa, na
cantina de uma academia no bairro do Cachambi, na
Zona Norte carioca.

“Outro dia, vinha para cá a pé, quando o segurança de
uma loja me cumprimentou. Custei a reconhecer, por
causa da máscara no rosto. Quando vi, era um dos
melhores aderecistas do Carnaval”, contou Schall. O
encontro casual sintetiza bem como esses profissionais
têm se virado em meio à escassez. “Acreditava que
tinha uma casa de concreto, ou pelo menos de madeira,
para suportar os sopros. Hoje, vejo que era de palha.
Há muitas entidades carnavalescas pelo Brasil que
correm o risco de desaparecer”, lamentou ele, que já foi
diretor de escolas como Mangueira, Vila Isabel e
Paraíso da Tuiuti, além de escolas de samba de São
Paulo e Porto Alegre.

Marlon Lamar, responsável por conduzir o pavilhão da
Portela, teve de entregar o apartamento em que vivia no
Rio e voltar para a Cidade Tiradentes, na Zona Leste
paulistana, onde, aos 8 anos, começou a trilhar sua
carreira, na ala mirim da escola do bairro, a Príncipe
Negro. Longe dos ensaios com sua porta-bandeira,
Lucinha Nobre, a suspensão do Carnaval também
abalou um outro sonho: a faculdade de medicina. Sem o
salário do samba, ele não pôde pagar a rematrícula. E,
agora, teme que uma luta de anos se perca no meio do
caminho.

“Tive crises de ansiedade absurdas. Ainda assim, creio
que minha história mostra que vale a pena correr atrás.
Se, quando menino, eu tivesse falado que seria um
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