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Revista Carta Capital/Nacional - Colunistas
sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021
Cenário Político-Econômico - Colunistas
No que diz respeito à América Latina, uma única
medida, mas altamente simbólica. O Departamento do
Tesouro emitiu uma licença que flexibilizou as sanções
impostas à Venezuela em 2019 e que permite agora
transações comerciais por via marítima e aérea com
aquele país. Alguns dirão que nada mudou. Talvez, mas
também é certo que todas as mudanças começam
assim, com pequenos passos. A América Latina, no
meu ponto de vista, é uma das áreas da geopolítica
onde se esperam mudanças significativas. Bem sei que
essa é uma parte do mundo onde os Estados Unidos
exercitaram o pior da sua força imperial. A minha
geração cresceu politicamente testemunhando a
violência e a brutalidade da intervenção norte-
americana na guerra suja de El Salvador, na ditadura
militar no Brasil, na Argentina e no Chile. A chamada
Longa Paz da Guerra Fria foi um desastre para os
regimes democráticos no Centro e no Sul do continente
americano. E, no entanto, antes disso, houve um
pequeno período em que a política dos EUA foi
diferente. Em 1933, o presidente Roosevelt, depois de
tomar posse, retirou tropas das Caraíbas, revogou a
Emenda Platt da Constituição cubana, que conferia aos
Estados Unidos o direito de intervirem na política
daquele país, e decretou um absoluto princípio de não
intervenção militar nas decisões soberanas das
restantes nações da América Latina. Dirigindo-se à
União Pan-Americana diria: “O vosso americanismo e o
meu devem constituir uma estrutura construída na base
da confiança, cimentada na simpatia que reconhece
somente igualdade e fraternidade”. Esse foi o mais
longo período de paz, cooperação e desenvolvimento
econômico, que durou até 1947. Essa política ficou para
a história como a “política de boa vizinhança”, que, no
dizer de um historiador que aprecio, salvou os Estados
Unidos de si próprios. Infelizmente, o que se passou a
seguir deixou no esquecimento esse período.
Não tenho ilusões. Um país com a força militar dos EUA
vai continuar a ser um império. Talvez nem sequer
esteja nas suas mãos escolher não o ser. Mas
justamente por isso vai precisar de uma política
abrangente para a América Latina. Nessa política
haverá duas coisas que tenho por certo. Primeiro, ela
não será construída com base em alianças com quem
esteve ao lado daqueles que ameaçaram a sua própria
democracia, e esse é, infelizmente, o caso do atual
governo brasileiro. Desculpem, mas não resisto: não
haverá mais “presentes da CIA”. Em segundo lugar,
para construir essa nova política, não precisarão de
outra coisa que não seja procurar inspiração no melhor
da sua história.
Assuntos e Palavras-Chave: Cenário Político-
Econômico - Colunistas