Clipping Banco Central (2021-02-13)

(Antfer) #1

FERNANDO REINACH - A cura pelo camundongo


Banco Central do Brasil

O Estado de S. Paulo/Nacional - Metrópole
sábado, 13 de fevereiro de 2021
Cenário Político-Econômico - Colunistas

Clique aqui para abrir a imagem

Ao contrário da maioria dos seres vivos, o genoma do
SARS-CoV-2 não é composto por DNA, mas por uma
longa molécula de RNA. Para se reproduzir dentro das
células o vírus utiliza uma enzima produzida por ele
mesmo, capaz de duplicar essa molécula de RNA. O
interessante é que essa enzima não existe em células
humanas e por esse motivo inibidores específicos são
drogas que podem impedir a reprodução do vírus. Um
deles, chamado EIDD2801, já está em Fase 2/3 de
estudos clínicos e se tudo correr bem pode estar
disponível como um comprimido no futuro.


Mas o que quero contar é um dos trabalhos que levaram
os cientistas a acreditar num futuro brilhante para o
EIDD-2801. Os cientistas gostariam de estudar
diretamente o estrago que o Sars-CoV-2 faz no pulmão
das pessoas infectadas. Como não é eticamente
aceitável retirar o pulmão de pessoas durante a
infecção, a solução é estudá-la em camundongos e
macacos. Mas mesmo um macaco não se comporta
como um ser humano quando infectado. É aí que entra
a criatividade. Os cientistas descobriram que se você
transplantar um pedaço de pulmão humano debaixo da
pele das costas de um tipo de camundongo que não


rejeita transplantes, um pequeno pulmão ali se
desenvolve e suas células e outros componentes são
humanos. As veias e artérias humanas se ligam às do
camundongo e você acaba com um quase pulmão
humano no corpo de um camundongo.

E aí você pode estudar tudo o que acontece quando um
coronavírus infecta um pulmão humano. E pode injetar
drogas no camundongo para observar o que acontece
nesse pulmão.

Na primeira parte do trabalho os cientistas mostram que
esse pulmão é infectado por todos os tipos de
coronavírus, incluindo o Sars-CoV-1 e o Mers-CoV. Mas
grande parte do estudo é dedicada a demonstrar que
uma infecção desse pulmão pelo SarsCoV-2 é idêntica
à que ocorre em seres humanos. O vírus se liga ao
mesmo receptor, invade as mesmas células, provoca a
morte das células atacadas e o acúmulo de células
mortas nos alvéolos, além de provocar o aparecimento
de trombos e a tempestade de citocinas. Como nos
seres humanos, os primeiros sintomas aparecem dois
dias após a infecção. Ou seja, esse pulmão humano
crescido dentro do camundongo responde da mesma
maneira à invasão do Sars-CoV-2 dentro de um pulmão
de um ser humano.

Na segunda parte do trabalho os cientistas estudaram o
que acontece com a infecção pelo Sars-CoV-2 se o
camundongo é tratado com o EIDD2801. O experimento
é simples: você infecta o pulmão com o vírus e depois
trata o camundongo com o EIDD2801, espera um
tempo, sacrifica o camundongo, e observa o que
acontece em seu pulmão. Foram inúmeros os
experimentos, mas aqui vai o que me pareceu mais
relevante.

Se o tratamento com a droga começa dois dias após a
infecção, quando a destruição do pulmão já está em
andamento, e dura dois dias, a quantidade de vírus no
pulmão diminui 25.000 vezes quando comparada com
um pulmão não tratado. Os seja, quase elimina o vírus.
E se você espera mais dois dias para começar o
Free download pdf