Clipping Banco Central (2021-02-13)

(Antfer) #1

'Mercado irritadinho


Banco Central do Brasil

O Estado de S. Paulo/Nacional - Notas e Informações
sábado, 13 de fevereiro de 2021
Cenário Político-Econômico - Colunistas

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O presidente Jair Bolsonaro declarou que quer "tratar de
diminuir impostos num clima de tranquilidade, não num
clima conflituoso", numa referência à sua intenção de
reduzir os impostos federais sobre os combustíveis para
baratear o diesel e agradar aos caminhoneiros.
Queixou-se de que "o pessoal do mercado" fica
"irritadinho" com "qualquer coisa que se fala aqui". E
insistiu: "Vamos deixar de ser irritadinhos, que isso não
leva a lugar nenhum. Uma das maneiras de diminuir (o
preço do) combustível é com o dólar caindo aqui dentro.
Mas qualquer negocinho, qualquer boato na imprensa,
tá o mercado irritadinho, sobe o dólar". Arrematou
dizendo que "o mercado tem que dar um tempinho
também" e que "um pouquinho de patriotismo não faz
mal a eles".


É preciso um esforço considerável para traduzir o
dialeto primitivo do sr. Bolsonaro, mas presume-se que
o presidente da República tenha tentado expressar sua
contrariedade com o fato de que o mercado reage mal
sempre que se fala em intervir em preços.


Bolsonaro nunca escondeu que não entende nada de
economia. Ainda na campanha, avisou aos eleitores que


era um ignorante completo sobre o assunto, deixando
todas as questões relativas a esse tema para serem
respondidas pelo hoje ministro da Economia, Paulo
Guedes.

Já na condição de presidente, disse que não era
economista e que, por esse motivo, não conseguia
entender por que razão a Petrobrás eventualmente
reajustava os preços dos combustíveis acima da
inflação. Em abril de 2019, a Petrobrás havia majorado
o preço do diesel em 5,7%, e Bolsonaro informou ter
mandado a estatal suspender o aumento até que lhe
explicasse "o porquê dos 5,7% quando a inflação
projetada para este ano está abaixo de 5%". Ato
contínuo, as ações da Petrobrás despencaram, ante a
óbvia intervenção do presidente.

Passados quase dois anos, aparentemente nenhum dos
auxiliares de Bolsonaro foi capaz de explicar-lhe que um
presidente da República, por mais poderoso que se
considere, não deve interferir na formação dos preços
da Petrobrás.

Na última vez em que isso foi feito explicitamente,
durante o governo de Dilma Rousseff, a estatal
contabilizou um dos maiores prejuízos de sua história,
por ter sido obrigada a subsidiar os preços dos
combustíveis para tentar conter a escalada da inflação
às vésperas da eleição presidencial de 2014. Como a
Petrobrás é uma empresa com ações em Bolsa e deve
satisfações a investidores privados, não pode estar
sujeita aos humores políticos, naturalmente instáveis, a
ponto de tornar imprevisível o processo decisório da
empresa.

Mas o problema transcende a Petrobrás. Um governo
que interfere diretamente nos preços dos combustíveis
cruza uma espécie de Rubicão da administração
pública, pois deixa claro que não respeita os
fundamentos da economia de mercado e é capaz de
tudo para satisfazer aos interesses políticos.

Um presidente da República não precisa entender de
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