Acima do cálculo
Banco Central do BrasilFolha de S. Paulo/Nacional - Opinião
quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021
Cenário Político-Econômico - ColunistasClique aqui para abrir a imagemDiz uma máxima da política que a oposição não vence
eleições, o governo é que as perde. No contexto
brasileiro, pode-se aplicar a mesma lógica a processos
de impeachment: o presidente é que cria o ambiente
para sua deposição, ao cometer crimes de
responsabilidade e, sobretudo, ao perder a sustentação
popular e congressual.
A oposição a Jair Bolsonaro, conforme relato desta
Folha, avalia que não dispõe hoje da segunda condição.
Embora a reprovação ao chefe de Estado tenha subido
de j á elevados 32%, em dezembro, para 40% em
janeiro, segundo o Datafolha, a parcela dos que
defendem seu afastamento é de expressivos mas ainda
minoritários 42%.
O apoio ao mandatário no eleitorado - 31% consideram
sua gestão ótima ou boa e 53% se opõem ao
impeachment - mostra-se grande o bastante para
desencorajar a maioria do Congresso a levar adiante
um processo tão traumático.
Teme-se também que uma tentativa derrotada em
plenário, como foram as duas contra Donald Trump nos
Estados Unidos, resulte em fortalecimento de Bolsonaro
e suas fantasias persecutórias.Mais ainda, o Planalto desde o ano passado emprega
cargos e verbas governamentais para cooptar
parlamentares de conduta fisiológica, em estratégia que
teve seu maior sucesso na eleição de seus candidatos
às presidências da Câmara dos Deputados e do
Senado.Sua base de sustentação busca agora a prorrogação do
auxílio emergencial - providência, em si, inatacável -
com o objetivo de conter o desgaste do presidente e
elevar suas chances em2022, favorecidas pela
fragmentação de lideranças oposicionistas.Resta um porém a impedir que se deixe de lado o
debate do impeachment - trata-se da conduta
insistentemente indecorosa de Bolsonaro, que
emporcalha o cargo máximo da República como
nenhum antecessor se atreveu a fazer.Está-se diante de um presidente que sabotou de todas
as maneiras as políticas de saúde durante a pandemia;
que declarou o intento de intervir em órgãos de
segurança para proteger familiares; que apenas em
recuo tático parou de insuflar atos contra os outros
Poderes.Seus impulsos autoritários permanecem, como o
demonstra mais um ataque a veículos de imprensa,
entre eles este jornal, que defendeu "tirar de circulação".
É risível a ressalva de que não o faria por ser um
democrata; não o fará, isso sim, porque está submetido
às regras da democracia.Estas, acima de qualquer cálculo político, recomendam
que o Congresso exerça o papel que lhe cabe ante os
desmandos do presidente. É necessário desengavetar e
examinar às claras, conforme os trâmites legais, as
dezenas de pedidos de impeachment que aguardam
decisão do presidente da Câmara.