Dívida preocupa emergentes?
Banco Central do BrasilO Estado de S. Paulo/Nacional - Economia
quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021
Banco Central - Perfil 1 - DéficitClique aqui para abrir a imagemOs ministros das finanças do passado ficariam
chocados com a quantidade de empréstimos com que
seus sucessores estão lidando agora. Mas ficariam
igualmente pasmos ao ver como esse empréstimo
acabou saindo barato. Em muitos países, espera-se que
a taxa de juros da dívida pública permaneça abaixo da
taxa de crescimento nominal da economia. Em outras
palavras, a "taxa de juros corrigida pelo crescimento"
será negativa. É o que acontecerá em todos os países
ricos em 2023, de acordo com projeções publicadas no
início deste mês pela agência de classificação de risco
S&P Global.
Esse cenário levou economistas como Olivier
Blanchard, ex-economista-chefe do FMI, a repensar os
limites fiscais de países como Estados Unidos, Japão e
membros da zona do euro. Os governos não deveriam
"se concentrar em algum número mágico para a relação
dívida/PIB", disse no mês passado em palestra na
Universidade Ashoka, na Índia. Esses números "foram
contraproducentes no passado; e seriam ainda mais
agora".
Não é só nos países ricos que a aritmética fiscal parece
estar de cabeça para baixo. Em 53 das 60 maiores
economias emergentes, a taxa de juros deve ficar
abaixo da taxa de crescimento. Em alguns casos, de
maneira espetacular. A S&P espera que a taxa de juros
corrigida pelo crescimento em 2023 seja de -3,6% na
Índia, -6,5% na China e -33,8% na Argentina.As economias emergentes também deveriam repensar
seus limites fiscais? Algumas o fizeram sem pensar
duas vezes. O orçamento da Índia este mês previu um
déficit de 9,5% do PIB no ano fiscal (o déficit geral,
que inclui as finanças do estado, poderia chegar a 15%
do PIB, calcula o banco JPMorgan Chase) e não
ofereceu nenhum plano para reduzi-lo abaixo do limite
de 3% prescrito pelas regras fiscais anteriores. A última
pesquisa do principal conselheiro econômico do
governo aponta que a taxa de juros da Índia tem estado
abaixo de sua taxa de crescimento "como norma, não
como exceção". Citando o trabalho de Blanchard, a
pesquisa tenta "fornecer a âncora intelectual para o
governo ficar mais relaxado em relação à dívida e aos
gastos fiscais durante uma desaceleração do
crescimento ou uma crise econômica". Mas, embora a
matemática fiscal contrária ao aumento de juros seja a
norma em muitas economias emergentes, os ministros
das finanças também precisam se preocupar com as
exceções.Quando as taxas de juros ficam aquém das taxas de
crescimento, a álgebra orçamentária vira do avesso. Os
governos conseguem manter a dívida estável em
relação ao tamanho da economia, mesmo que gastem
consistentemente em excesso, desde que seus déficits
orçamentários não sejam muito grandes. Se seus
déficits (excluindo os pagamentos de juros) excederem
o limite, o índice da dívida aumentará por algum tempo.
Mas, depois, diminuirá gradualmente ao nível anterior.
Se seus déficits passarem para um nível
permanentemente mais alto, o índice da dívida também
se acomodará em um nível mais alto. Mas não crescerá
como uma bola de neve, porque a força dos juros
compostos é compensada pela força do crescimento
composto.