(20201100-PT) Exame Informática 305

(NONE2021) #1
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esta ideia não é nova, os jornais também começaram assim,
disputando a nossa atenção.
A questão é a intensidade?
Exato e o alvo individualizado. É tão eficaz que há muita gente
convencida de que há alguém a ouvir as nossas conversas. Há
uma série de exemplos que mostram que, de certa forma, o
sistema conhece a pessoa melhor do que ela própria.
Mesmo assim mantém uma posição positiva?
Sim, há coisas boas. A Medicina por exemplo está a ser com-
pletamente mudada pela IA, daqui a vinte, dez anos há muita
coisa que vai deixar de feita por pessoas, como olhar para
imagens médicas. Aliás, já aconteceu antes, só que na altura
não se associava a algo negativo. Por exemplo, as análises
clínicas, há 70 anos, eram feitas por um senhor analista num
laboratório, com os reagentes e no microscópio a contar células.
Hoje já nada disso é assim, é tudo automático. E as pessoas não
ligaram muito a esta mudança, não se chatearam.
Esta visão otimista/pessimista também está dependente
de quem domina o sistema, se é a China, a Europa...
Que não está a dominar...
Exato. Ou a América do Trump...
A campanha do Obama foi a primeira a ser feita com recurso
a IA, a do Trump foi muito eficaz – e teve ajuda dos russos que
são excecionalmente bons nisso. Esta novidade, que permite
que um país interfira noutro, à distância, sem sequer precisar
de ir lá...Isto é impressionante!
Este consórcio de que o Técnico faz agora parte está in-
tegrado numa estratégia assumida de combate à China?
Sim, combate no sentido muito vago do termo. É mais com-
petição, a nível científico. Uma das razões para a Europa estar
para trás nesta área é porque não há nenhuma grande empresa
assente em IA e em dados, como existe na América, com a
Google, Facebook, Amazon, Apple. E a Europa não tem nada
deste calibre porque está partida aos bocadinhos. Não há uma

C


om a criação de um polo no Técnico, Portugal passou
a fazer parte da rede ELLIS – de Laboratório Europeu
para Sistemas Inteligentes e de Aprendizagem – que
agrega 30 unidades de investigação europeias dedi-
cadas à Inteligência Artificial, com o objetivo de pôr a Europa
no mapa da inovação nesta área. Com este novo polo, Mário
Figueiredo espera que se quebrem barreiras entre institutos,
departamentos e ‘quintas’ e aumentar a colaboração com a
indústria.
Sempre que se fala em Inteligência Artificial (IA), sente-se
uma polarização. O que não é comum noutras áreas do
conhecimento. Como se justifica esta tendência para as
pessoas da área serem entusiastas ou temerosas?
É verdade que temos os otimistas que acham que um dia vai
ser possível ter uma IA tão inteligente como os humanos e os
que dizem que isto não irá acontecer, pelo menos nos próximos
séculos. Esta é uma das possíveis divisões entre otimismo/
pessimismo. E depois há a outra divisão: quem se refira aos
sistemas de IA como ‘os nossos descendentes’ e quem os veja
como uma ameaça terrível.
E qual é a sua posição?
Eu acho que está ainda tão distante [a possibilidade de a IA
ultrapassar a capacidade humana] que não temos de nos
preocupar com isso. Há ainda outra divisão que tem a ver
com o impacto da IA, dos algoritmos na sociedade. Há quem
tenha uma perspetiva pessimista. E depois há quem diga que
o mal não está na IA mas no utilizador, numa argumentação
semelhante à utilizada na questão das armas. Há aspetos
negativos, sem dúvida, como o caso Cambridge Analytica
[consultora que esteve envolvida na campanha do Brexit], o
Facebook e todo o tempo que gastamos nas redes sociais, a
disputa pela nossa atenção. No fundo, é isso que as platafor-
mas fazem e de uma forma muito eficiente. Usam a IA para
prender a nossa atenção e depois vendem-na. É claro que

OTIMISTA


MODERADO


Na discussão entre defeitos e virtudes da Inteligência Artificial,
o especialista em machine leaning assume uma posição de meio termo.
E admite que o algoritmo pode mesmo ajudar a combater
o preconceito e os enviesamentos inerentes ao Homem

Tex t o Sara Sá Fotos D.R.

MÁRIO FIGUEIREDO
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