78
NOTA FINAL
ALTOS E BAIXOS
+
N
inguém gosta de comprar um produto es-
tragado. E isso foi o que aconteceu a milhões
de jogadores quando ‘ligaram’ Cyberpunk
2077 na PlayStation 4 e na Xbox One. Em dezembro,
o jogo não estava otimizado para estas consolas,
estava repleto de falhas técnicas, erros bizarros e
tinha fortes quebras de performance... Aquele que
era um dos títulos mais esperados dos últimos anos
transformou-se numa novela com um dos finais
mais dramáticos de 2020. O estúdio CD Projekt
começou a atualizar o jogo e a corrigir os erros. E nós
decidimos esperar. Mas mesmo após as melhorias
entretanto já feitas, Cyberpunk 2077 continua ‘ava-
riado’. Ainda há quebras de performance difíceis de
ignorar e que arruínam a experiência de jogo, assim
como motas a cair do céu e corpos a aparecerem
por cima de carros.
Mas o que senti, acima de tudo, é que falta subs-
tância ao jogo. Cyberpunk 2077 leva-nos para uma
cidade futurista, Night City, que está totalmente
dominada pelos grandes senhores do crime. Assu-
mimos o papel de V, um mercenário contratado para
fazer trabalhos nos quais mais ninguém arriscaria
o pescoço. Cyberpunk 2077 mistura elementos de
um role playing game – um mapa gigante, forte
ênfase nos diálogos, possibilidade de evoluir ca-
pacidades técnicas, ‘side quests’ para fazer – e de
um shooter na primeira pessoa, mas a combinação
não é convincente. O jogo tem uma evolução muito
lenta. Por exemplo, nas primeiras quatro horas
de jogo, só houve um tiroteio digno desse nome.
Existe diálogo em demasia e passamos demasiado
tempo a pressionar o mesmo botão para escolher
opções de diálogo que, na maior parte das vezes,
nem sequer têm um efeito direto no desenrolar
daquele momento. Apesar de ser um mundo aberto,
sentimos que a ação da história principal é linear,
está empurrar-nos de um lado para o outro, mas
sem sair do 'carril'. Faz isto, faz aquilo, vai aqui, vai
acolá, sem acrescentar muito pelo meio que nos faça
apaixonar por aquelas personagens. Senti-me mais
um moço de recados do que um mercenário que,
aos poucos, faz tremer os donos de Night City. Se
noutros jogos já fiquei de coração apertado ou soltei
umas gargalhadas com as personagens, aqui senti
que estava rodeado de durões ocos que só querem
salvar a própria pele. Para compensar, há dezenas
de missões secundárias, o que é bom, mas até aí
há momentos em que parece que o nosso número
de telefone caiu nas mãos de uma empresa de te-
lemarketing, já que não para de tocar.
Este não é, no entanto, o pior jogo do mundo,
como por vezes também parecem fazer crer. Do
que gostei mais em Cyberpunk 2077? O design das
personagens é excelente e visualmente impactante.
A cidade tem uma vida muito própria, a qualquer
lugar que vamos, sentimos que somos apenas uma
pequena peça num mundo que gira mesmo que nada
façamos. A componente de piratear lembranças é
uma adição diferenciadora. E apesar de evolução
lenta, a história lá acaba por nos dar um elemento
- Keanu Reeves, que interpreta Johnny Silverhand,
uma surpresa que teria sido estrondosa se não tivesse
sido esgotada em campanhas de marketing – que
torna o jogo menos cliché. Apesar de ser grande em
tudo, Cyberpunk 2077 não fez, pelo menos para mim,
o suficiente para evitar sentir que é... aborrecido.
Não terminei e sinto pouca vontade em fazê-lo.
A CD Projekt focou-se tanto na cosmética do jogo
que a parte técnica tornou-se demasiado complexa
de gerir e esqueceu-se que, mais do que o ambiente
que nos rodeia, é o enredo, as personagens e a sua
combinação que fazem ou não um jogo ficar para a
história pelos melhores motivos. Fico com a sen-
sação de que o estúdio tentou criar o seu próprio
GTA, mas a falta de profundidade nunca fará de V e
companheiros memoráveis, justamente o lema que
tanto os move em Night City. Rui da Rocha Ferreira
3,5
PC, PS4 (testado),
PS5, Xbox One, XSX
Night City
é um cenário
belíssimo e cheio
de vida própria
O design de
personagens,
isso sim é memorável
Aquilo foi uma mota
a cair do céu?
Para um jogo
que prometia definir
uma geração,
é aborrecido