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(Antfer) #1

DANIEL MARTINS DE BARROS - Empatia no lugar certo


Banco Central do Brasil

O Estado de S. Paulo/Nacional - Metrópole
segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021
Cenário Político-Econômico - Colunistas

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Autor: DANIEL MARTINS DE BARROS


A imaginação humana é uma poderosa arma não
domesticada. Sua força está em seu enorme potencial,
capaz de criar a manipular cenários em combinações
praticamente infinitas. Tal poder é, ao mesmo tempo, a
raiz de seu descontrole, pois quanto mais possibilidades
nossa mente nos apresenta, menor a probabilidade de
acertar na previsão do que realmente acontecerá.
Expectativa e realidade raramente coincidem, como
mostram os memes na internet.


Há um ano, como você imaginava que seria o
desenrolar da pandemia? Meus devaneios antecipavam
o apocalipse zumbi, por um lado, ou um mero susto, por
outro. Temia o pior, esperava o melhor. (Ou seria o
contrário?) Mas veio a realidade, que paradoxalmente
tem um pouco de cada cenário. No lado catastrófico,
quase 250 mil mortos, mais de dez milhões infectados,
a maioria carregando alguma sequela maior ou menor.
Centenas de milhares de famílias em luto. Tal realidade
convive com a da vida normal para outros milhões de
cidadãos.


Não só para aquela minoria - barulhenta e incômoda -
que ignora a pandemia, mas também para o grande
contingente que, com as adaptações necessárias,
acorda cedo, coloca os filhos na escola e trabalha -
online ou não -, passeia onde dá, lamenta as perdas
quando elas chegam, e segue em frente.

Se isso é verdade, precisamos de es- tratégias
diferentes para lidar com dois problemas diferentes: a
atitude de quem não foi diretamente afetado pela
pandemia e o sofrimento dos que foram. Uma visa a
mobilizar indivíduos em prol da coletividade. Outra,
mobilizar a coletividade em prol dos indivíduos. A
primeira se alcança só com coerção, não tem jeito. Não
adianta apelar para a compaixão, brandir números de
mortes. Não é maldade. Não é falta de empatia. É do
ser humano.

A morte nessa escala industrial pode ser compreendida
como tragédia na- cional, mas não será sentida como
pessoal - ninguém perdeu 250 mil amigos próximos.
Tanto é assim que quanto mais mortes, menos
parecemos ser afetados. A frase famosa de que a morte
de alguém é tragédia, mas a de milhões é estatística
tem sido confirmada por pesquisas científicas. Quanto
mais afetados por um evento, menos impacto sobre as
pessoas. A anestesia psíquica reduz a percepção do
valor de salvar vidas e embaça a capacidade de avaliar
perdas. A gente passa a se importar mais com a
proporção de salvos do que com o número absoluto de
mortes.

Não é coincidência que diuturnamente testemunhemos
uma guerra de narrativas sobre a pandemia. Um lado
mostrando o número de mortos no País, outro insistindo
em apresentar as mortes por milhão. Para mudar o
comportamento individual de quem não foi
pessoalmente afetado, a estratégia tem de ser
obrigatoriedade de máscaras, proibição de
aglomerações, fiscalização rigorosa, multa, sanções.

Para os milhares pessoalmente afetados, a história é
outra. Embora a maioria das pessoas atravessando
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