Exame Informatica - Janeiro 2021

(NONE2021) #1
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O engenheiro civil alemão de 66 anos deixará a
presidência da Agência Espacial Europeia, para a
qual foi nomeado em 2015, dentro de seis meses.
Professor na Universidade Técnica de Darmstadt e
especialista em sismos – em particular no seu impacto
nas centrais nucleares do Japão – foi membro do
Conselho de Administração de diversas universidades
europeias, incluindo o Técnico, em Lisboa.

toda a diferença. Somos 22 estados-membro e juntos conse-
guimos alcançar o que nenhum estado sozinho consegue. De
outro modo, competimos com a NASA em várias áreas. Mas
na Estação Espacial Internacional (ISS) cooperamos. Porque
sozinhos não conseguimos.
Uma das apostas claras da ESA, na qual Portugal participa,
é a remoção do lixo espacial. Não deveria ser uma respon-
sabilidade de todos os países envolvidos no setor espacial?
Para nós é um setor muito importante. Não só a remoção como
a revalorização. Por exemplo, os rovers da Missão Apolo con-
tinuam na Lua. Podem ser reutilizados lá mesmo. O problema
da acumulação de lixo espacial representa um desafio global.
É preciso começar por algum lado e a Europa está a dar o
exemplo. Quem acredita que é preciso mudar alguma coisa
deve ser o primeiro a fazê-lo. Conseguir convencer todos os
estados-membro da importância desta missão.
E países como a China, que já começam a ter muita relevância
no setor espacial, como encara o problema?
A China já é responsável por muito lixo espacial. Serão con-
vencidos da importância de o remover ao primeiro acidente
que tiverem. É uma questão ética e moral.
De que forma a pandemia está a afetar o setor do espaço?
O espaço e a pandemia têm uma relação muito próxima. Da
mesma forma que temos de aumentar a consciencialização
acerca das alterações climáticas, descobertas antes de mais
no planeta Vénus, também temos de o fazer relativamente ao
vírus. A tecnologia espacial pode ser usada na monitorização
da evolução da pandemia. E também na mitigação. Tal como
acontece com as alterações climáticas, em que se faz mo-
nitorização a partir do espaço, estamos a ajudar na crise da
Covid, com os instrumentos que temos no espaço, durante
os lockdowns. As pessoas estão em casa e não sabem como
sobreviver em isolamento. E nós estamos a partilhar informa-
ção, através dos nossos astronautas porque eles sabem como
sobreviver em isolamento, mesmo no espaço. Aprendemos,
com a investigação feita em astronautas a viver no espaço,
qual o impacto do isolamento e temos vindo a partilhar esta
informação com os médicos. Também temos colaborado na
impressão 3D de materiais de proteção e ventiladores. Ou seja,
entre o espaço e a pandemia há uma forte ligação.
E financeiramente? Será possível aos estados-membros
manter o orçamento dedicado ao espaço agora que têm de
enfrentar esta crise mundial? Está a afetar ou irá afetar?
Até agora nada. Todos os estados mantiveram o nível de com-
promisso. Mas a verdade é que também não se trata de um valor
assim tão elevado. Ao todo, dos 22 estados-membro, recebemos
anualmente quatro mil milhões de euros. Se compararmos
com os 700 mil milhões que estão a ser gastos para fazer face
à pandemia não é nada. E o espaço é muito importante para
várias áreas. Alterações climáticas, comunicação, navegação.


Portanto, não assistimos, em nenhum estado-membro, a uma
redução no investimento.
Agora uma questão mais filosófica. Como vê o espaço nos
próximos 50 anos? Imagina uma base na Lua, voos comer-
ciais regulares?
(Risos) Sou muito velho para pensar nos próximos 50 anos...
Pense no futuro dos seus netos...
Bem, tenho filhos, mas infelizmente não tenho netos. Mesmo
assim consigo responder. Tenho uma visão, que já publiquei há
uns dez anos, de uma vila-lunar. Uma povoação na superfície
da Lua. E a ideia não é a de que estaremos a colonizar a Lua,
enviando pessoas para morarem lá até ao fim das suas vidas.
Mas é a de que esta base será usada por diferentes entidades,
públicas, privadas, internacionais e estas atividades na Lua
serão conjuntas. Referiu-se à questão como filosófica. Eu digo
que é geopolítica. Porque teremos diferentes estados a trabalhar
em conjunto, para lá das eventuais crises terrestres. E esta ideia
de vila-lunar, que formulei há cerca de uma década, ou até
mais, foi primeiro recebida com gargalhadas. Questionavam-
-me “porquê ir para a Lua?” E agora a verdade é que muitos
países estão a ir à Lua. A China acabou de aterrar lá. E tudo isto
encaixa perfeitamente nos planos que eu tinha elaborado para
uma vila-lunar. É claro que também haverá astronautas a lá ir
e eu espero que dentro de dez anos haja astronautas europeus
a ir à Lua. Mas reforço, não irão lá para ficar, porque a Terra é
muito melhor do que a Lua. Mas acredito que irão trabalhar
em conjunto na superfície da Lua, resolvendo desta forma
as crises terrestres. Tal como já acontece na Estação Espacial
Internacional. Não é preciso um visto ou um passaporte para ir
do setor russo da ISS ao americano ou ao japonês. Isto mostra
que é possível trabalhar em conjunto e no espaço acaba por
ser mais fácil do que na Terra.
É a ideia do espaço como um instrumento para a paz?
É um instrumento de paz, definitivamente! Mesmo durante
a guerra da Crimeia, e outras, a ISS continuou a ser usada por
todos os países. E aconteceram outras crises que em nada
afetaram o funcionamento na Estação. No espaço trabalhamos
com os chineses, por exemplo, apesar de na Terra existirem
algumas questões. Diferentes países trabalham em conjunto,
independentemente do que se passa na Terra. Portanto, o espaço
é, sem dúvida, um forte instrumento geopolítico para a paz.
No espaço não há fronteiras?
Não há. Aliás, do espaço, a única fronteira que se vê é entre a
Coreia do Norte e a Coreia do Sul – isto porque a Coreia do Norte
é escura, por não haver eletricidade, e a Coreia do Sul é clara. Ao
contrário do que muita gente pensa, nem sequer a muralha da
China é visível de lá. Na Europa não vemos qualquer fronteira,
qualquer separação entre os países. O meu sonho seria que
existissem os Estados Unidos da Europa. Mas o que eu acredito
que estamos a construir é o Espaço Unido da Europa.

JAN WOERNER

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