National Geographic - Portugal - Edição 240 (2021-03)

(Antfer) #1
Ray originalmente. Desta feita, porém, o juiz que
proferiu a sentença decidiu que a prisão perpétua
era mais adequada.
A mãe e o padrasto de Ray recusaram-se a de-
sistir da convicção de que o filho era inocente.
Hipotecaram a casa e contrataram um advogado
para analisar as provas recolhidas no decurso da
investigação original. Apesar das objecções le-
vantadas pelo procurador, um juiz aprovou um
requerimento apresentado pelo advogado da fa-
mília no sentido de as amostras de DNA serem
examinadas por um laboratório independente.
Em Abril de 2002, os resultados dos exames
de DNA demonstraram a inocência de Ray Kro-
ne. Um homem chamado Kenneth Phillips, que
vivia a menos de um quilómetro de distância do
bar onde Kim fora assassinada, deixara o seu DNA
nas roupas que esta vestira. Phillips foi facilmen-
te encontrado: já estava na prisão por ter agredido
sexualmente e asfixiado uma menina de 7 anos.
Libertado da prisão quatro dias depois de os
resultados dos testes de DNA serem anunciados,
Ray tornou-se o centésimo homem nos Estados
Unidos a ser condenado à morte, desde 1973, e
posteriormente absolvido e libertado.

GARY DRINKARD não era nenhum menino do coro.
Já tivera os seus problemas com as forças da lei
quando Dalton Pace, um negociante de sucata, foi
assaltado e assassinado em Decatur, no estado do
Alabama, em Agosto de 1993.
Duas semanas mais tarde, a polícia deteve Gary,
então com 37 anos, quando Beverly Robinson,
meia-irmã de Gary, e Rex Segars, companheiro
desta, fizeram um acordo com a polícia que im-
plicava Gary no homicídio. Alvo de acusações de
roubo não ligadas a este crime, o casal concordou
em cooperar com a polícia e testemunhar que este
lhes contara ter matado Pace.
Quando conversei com Gary, este falava ain-
da com o arrastado sotaque do Sul. Só se exaltou
quando lhe pedi que descrevesse o tempo no cor-
redor da morte.

“Ficamos devastados ao ver que tudo aquilo
em que sempre acreditámos e defendemos nos é
retirado e sem justa causa”, contou Ray. “Eu era
tão ingénuo. Não acreditava que isto me pudesse
mesmo acontecer. Tinha prestado serviço militar
ao meu país. Trabalhei para os correios. Não era
perfeito, mas nunca me metera em sarilhos. Nun-
ca me fora passada uma multa de estacionamen-
to, mas ali estava eu, no corredor da morte. Foi
então que me apercebi de que, se aquilo me podia
acontecer, poderia acontecer a qualquer pessoa.”
O Gabinete do Procurador da Comarca de Ma-
ricopa gastou mais de 50 mil dólares na acusa-
ção, baseada na teoria da marca de mordedura,
enquanto o perito dentário consultado pelo de-
fensor oficioso de Ray Krone recebeu 1.500 dóla-
res. Esta discrepância na utilização dos recursos
disponibilizados a procuradores e advogados de
defesa em casos de pena capital gera resultados
previsíveis para os arguidos manietados por re-
presentação jurídica mal financiada e ineficaz.
Em 1995, Ray Krone conseguiu um novo julga-
mento, quando um tribunal de recurso decidiu
que os procuradores tinham ocultado indevida-
mente um vídeo da prova da mordedura até à
véspera do julgamento. Voltou a ser considerado
culpado. Os procuradores recorreram aos mes-
mos peritos dentários que tinham condenado

MAIS DE 70%


DA TOTALIDADE


DOS PAÍSES


REJEITARAM


A PENA


DE MORTE.


Depois de a mulher de
Randal Padgett, Cathy,
ter sido apunhalada em
Agosto de 1990, a polí-
cia acusou-o de homicí-
dio. O casal separara-se e
Randall, avicultor, namo-
rava com outra mulher.
No seu julgamento, em
1992, a acusação não
informou a defesa de

Randal
Padgett
COMARCA DE
MARSHALL, ALABAMA

5 ANOS NA PRISÃO,
TODOS NO CORREDOR DA MORTE;
ABSOLVIDO EM 1997

que o sangue recolhido
no local do crime não
correspondia ao de Ran-
dal. Quando tomaram
conhecimento disso, os
advogados de defesa
requereram a anulação
do julgamento, mas o
requerimento foi inde-
ferido pelo juiz. Depois
de Randal ser declarado

culpado, o mesmo juiz
condenou-o à morte.
Três anos mais tarde, o
Tribunal de Recurso Cri-
minal do Alabama orde-
nou novo julgamento,
invocando má conduta
da acusação. Hoje com
70 anos, Randal foi decla-
rado inocente e saiu
em liberdade.

(Continua na pg. 46)


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