Ana Maria - Edição 1185 (2019-07-04)

(Antfer) #1

| Sinta & liga |


WAL REIS
é jornalista e profissional
de comunicação
corporativa. Escreve
sobre comportamento
e coisas da vida: http://www.
walreisemoutraspalavras.
com.br/blog/

O


publicitário Washington Olivetto,
logo após ser resgatado de
seu cativeiro, depois de 52
dias sequestrado em 2002, disse aos
jornalistas uma frase que nunca esqueci:
“Fui vítima, não sou mais”. A tirada
supostamente visava aquietar quem
esperava fazer da passagem uma novela
mexicana, uma vez que ali estavam
todos os elementos para isso: quadrilha
internacional, um empresário conhecido,
cativeiro e a cadeia de coincidências
que o fizeram ser encontrado. Podia
mesmo ser uma jogada de marketing.
Mas, exceto pela menção obrigatória
à passagem em seu livro (Direto de
Washington, Editora Sextante), Olivetto
sempre evitou falar do sequestro. Ele
tinha sido vítima. Não era mais.
Temos motivos para nos vitimizarmos
em maior ou menor escala o tempo todo.
Sempre haverá uma razão para justificar
fraquezas, inoperâncias e equívocos.
Para a maioria, a culpa nunca nos cabe
totalmente. É fácil terceirizá-la.
Se você ficou órfão aos 10 anos,
descobriu ser adotado aos 20, teve
câncer, perdeu um filho, o marido, o
FOTO: GETTY IMAGESirmão. Perdeu emprego. Passou fome. ARQUIVO PESSOAL

A lista de
situações agudas
passíveis de
acontecer é
extensa. E a
dor e o trauma
marcam cada um
de uma maneira.
Não cabe julgar
a sequela que
acontecimentos
indesejáveis
imprimem...

Conviveu com guerra. Foi injustiçado.
A lista de situações agudas passíveis
de acontecer com humanos é extensa.
E a dor e o trauma marcam cada
um de uma maneira.
Não cabe julgar a sequela que
acontecimentos indesejáveis imprimem

porque existem feridas que ficarão
para sempre expostas, aquelas que
deixarão somente cicatrizes e outras
que servirão de muleta. Mas uma
existência manca, apoiada no
coitadismo, tem, infelizmente, caráter
epidêmico. Há certo conforto em
justificar o comportamento letárgico
com tragédias pessoais.
São pessoas que chafurdam na lama
ácida da autocomiseração, se negando
a levantar a cabeça e experimentar que
a vida é aquilo que acontece à frente
e nunca pelo espelho retrovisor. É
seguindo, com todos os nossos “apesar
de”, que temos a chance de escrever
novos capítulos, apurando os ouvidos
para escutar a música que nos convida
a dançar, lembrando que muletas só
vão atrapalhar os passos desse balé.

Envie suas perguntas para Thiago Vieira pelo e-mail [email protected] suas perguntas para Wal Reis pelo e-mail [email protected]

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