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Com passos leves, ela se achega ao balcão, respira como se fosse

falar, mas desiste. Leva a mão à altura do decote, onde um cordão

amarrado ao pescoço sustenta um pingente misterioso escondido no

vale entre os seios. Introduz a ponta dos dedos polegar e indicador

nesse lugar. O olhar do demônio é atraído para lá. De dentro dos

seios, ela não tira o pingente, mas um singelo bilhete. Fica na ponta

dos pés, apoia uma das mãos na borda do balcão enquanto o outro

braço se estica entregando o recadinho enfeitado ao Diabo. Este, por

sua vez, surpreende-se. Seus olhos acompanham o gesto da moça.

Quando ela lhe entrega o bilhete, seus dedos roçam a pele escamosa

do demo e se retraem. Por pouco, a prancheta não cai e acerta a

bruxa. Ela mantém a atenção nos dedos que tocaram o demônio.

Enlevada, esfrega-os muito lentamente.

CENA 5 ∙ INTERNA ∙ DIA ∙ INTERIOR DO DEPARTAMENTO DAS VOZES

PERDIDAS

O Diabo quase leva o bilhete até o nariz para sentir muito mais do

cheiro dela se alteando como uma névoa sinuosa e leve. Resiste. Abre

lentamente o papelzinho enfeitado que lhe foi entregue. Emprega

neste ato um tempo grande. Seus dedos se empenham em acariciar

o papel. O demônio se demora, acaricia o envelope singelo, com uma

flor de fuxico servindo-lhe de lacre. Toca a superfície com anotações.

Refaz, com a ponta dos dedos, os relevos formados pelos bordados.

Limpa a garganta e lê o que está escrito:

DIABO DA PRANCHETA: “Eu sou uma feiticeira nascida em

Encruzilhada dos Ventos, estou noiva de um elfo, quero casar, mas

perdi minha voz. Falaram para vir aqui falar com o senhor.

Por favor, eu lhe peço que me ajude. Iná”

Ele termina a leitura e pausa sorvendo o nome dela em sua boca

como se fosse o ar. Em torno, o tempo se ergue em partículas

suspensas de silêncio.

VOZ OFF DA NARRADORA

Depois de inspirar e reter o tempo e o vento nessa pausa, o Diabo

repete o nome da bruxinha. Emite a primeira sílaba como se ela

saísse de um macio recém-descoberto dentro si. Já a segunda