JL / 19 de junho a 2 de julho de 2019 • jornaldeletras.pt
A Avaliação Externa
Lurs PEREIRA oos SANTos
E PAULA SIMÕES
ti Elaborar as provas de avaliação
externa do sistema educativo
português e supervisionar o seu
processo de classificação. Eis a missão
central do Instituto de Avaliação
Educativa, l.P. (lAVE). Por outras
palavras, é responsabilidade do IA VE
recolher, de modo padronizado,
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a nível nacional, informação de
qualidade sobre o que os alunos
efetivamente aprenderam durante o
seu percurso escolar.
Assim, as provas de avaliação ex-
terna devem permitir aos alunos de-
monstrar o que sabem, m,as também
permitir-lhes perceber e ultrapassar
as suas dificuldades; as provas devem
ser imaginativas e variadas, apesar de
rigorosas do ponto de vista científico
e pedagógico; devem contribuir para
a diversificação das estratégias de
ensino e de aprendizagem, apesar de
claramente ancoradas nos referen-
ciais curriculares em vigor; devem
dar sinais claros às escolas, aos pro-
fessores, aos alunos e aos encarrega-
dos de educação de que a flexibilidade
e a diversidade curriculares podem
conviver com um sistema padroni-
zado de provas de avaliação externa,
não obstante o inipacto da sua função
certificadora e seletiva.
Tendo em conta estas ideias e o pa-
pel da avaliação externa no currículo,
do qual faz parte integrante, o IA VE
não pode atuar isolado, devendo, na-
turalmente, alinhar-se de modo es-
tratégico com as politicas educativas
e com as intervenções no currículo,
sempre em prol do sucesso educativo
dos alunos. Para isso, é fundamental
um relacionamento mais colabo-
ratiyo e de maior proximidade com
as escolas e com os restantes atores
do processo de desenvolvimento
do currículo, urna maior transpa-
rência relativamente aos processos
de elaboração dos instrumentos da
avaliação externa e urna maior con-
sistência na formação de professores,
no âmbito da avaliação.
NOS ULTIMOS TRES ANOS
f\LGUMAS ALTERACOE. nos
normativos legais e nos documentos
de orientação curricular colocaram o
lAVE perante desafios significativos
no sentido de alinhar as provas de
avaliação externa com os referenciais
curriculares e com a flexibilidade
curricular. Referimo-nos, especifi-
. camente, ao Perfil dos alunos à saída
da escolaridade obrigatória, aos
Decretos-leis n^2 s 54 e 55/2018, de 6
de julho, e às orientações curricula-
res explicitadas nas Aprendizagens
Essenciais. Fstes documentos
pressupõem um desenvolvirtlento
curricular enquadrado por valores
orientados para a construção de urna
cidadania ativa, por áreas de compe-
tência que promovem o desenvolvi-
mento, entre outros, do pensamento
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crítico, do raciocínio, da resolução de
problemas e da comunicação e infor-
mação, e por princípios de flexibili-
dade com recurso à autonomia e ao
trabalho colaborativo de natureza
inter e transdisciplinar e à diversida-
de de instrumentos e modali~des de
avaliação. Paralelamente, a rein-
trodução de provas de aferição no
ensino básico, .emsubstituição das
provas~ de ciclo e com objetivos
bem definidos quanto ao propósito
a que se destinam, obrigaram a que,
no lAVE, fosse levada a cabo urna
profunda reflexão sobre a necessária
harmonização entre as provas de
avaliação externa e o currículo.
Percebemos, então, que estamos
perante duas modalidades de ava-
liação externa, com propósitos bem
distintos e claramente enunciados
nos normativos legais: por um lado,
as provas de aferição, e, por outro,
as provas finais e os exames finais
nacionais. É importante que se clari-
''
O lAVE não pode
atuar isolado, devendo
alinhar-se de modo
estratégico com as
políticas educ~tivas e
com as intervenções no
currículo
Nenhuma flexibilidade
curricular pode
sobreviver sem
avaliação externa
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fiquem os objetivos principais de cada
uma delas. As provas de aferição,
aplicadas nos 22 , 52 e 82 anos de esco-
laridade, têm o propósito formativo
de acompanhar o desenvolvimento
do currículo e de dar informação
atempada aos intervenientes no pro-
cesso educativo, de modo a permitir
intervenções pedagógicas eficazes
durante o percurso de aprendiza-
gem dos alunos. As provas finais e os
exames finais nacionais, além deste
propósito formativo, servem também
para fins de certificação das apren-
dizagens no fim do percurso escolar,
sendo estes últimos utilizados ainda
como provas de ingresso no ensino
superior.
ESTA CLARIFICAÇAO E NECES-
fl1m para que se possam expli-
citar as alterações introduzidas e os
constrangimentos técnicos sentidos.
Começando por estes últimos, o
facto de se trabalhar com provas
públicas, ou seja, cuja divulgação,
conjuntamente com os critérios
de classificação, acontece imedia-
tamente após a sua aplicação, não
permite a utilização de ações e de
ferramentas de pré- testagem dos
itens das provas para posterior va-
lidação e calibração. Fsta limitação,
aliada à obrigatoriedade de produzir
provas comparáveis de ano para
ano, de modo a que se obtenham
resultados estáveis, condiciona em
elevado grau o trabalho das equipas
pedagógicas do lAVE.
Outro asptltO importante prende-
- se com a existência de um histórico
de provas e da previsibilidade que
a ele pode estar associada. Apesar
destes constrangimentos, algumas
decisões foram fundamentais para
garantir o requerido alinhamento
curricular e para se obter informa-
ção pertinente e rigorosa sem causar
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grandesperturbaçõesnaconceção
das provas. Assim, decidiu-se tornar
mais visível e percetfvel a distribuição
dos itens das provas por três níveis
de complexidade cognitiva, eviden-
ciando-a na informação sobre os
resultados fornecida nos relatórios de
escola das provas de aferição; alterar
o modo como os itens das provas são
concebidos, passando estes a estar
centrados em processos cognitivos
que possam tornar evidentes as áreas
de competência do Perfil dos alunos,
através da solicitação de respostas
contextualizadas, tendo em vista um
objetivo de avaliação para devolução
de informação (sem apelo exclusivo à
memorização de grandes quantidades
de "matéria" ... ); selecionarsuportes
de itens em função da interpretação e
do cruzamento da informação neles
contida; e, por último, mas nem por
isso menos importante, harmonizar
a distribuição da cotação pelos dife-
rentes itens das provas finais de ciclo
e dos exames finais nacionais, o que
teve como resultado uma diminuição
do número de resultados negativos,
apesar da relativa estabilidade das
médias por disciplina.
CRIARAM- SE IGUALMENTE. NO-
VOS INSTRUMENTO. de avaliação:
provas de aferição práticas, avalian-
do mais do que urna área curricular,
e a avaliação da produção oral nos
exames finais nacionais de Línguas
Estrangeiras. No entanto, a principal
novidade consistiu no modo como os
resultados das provas de aferição são
divulgados. A opção pela inexistên-
cia de urna classificação, não isenta
de polémica, mas fundamentada
na literatura da especialidade e em
estudos que evidenciam a menor
atenção dada à informação descritiva
em presença de urna classificação
quantitativa ou qualitativa, foi mUito
importante para a definição de um
modo de devolução dos resulta-
dos verdadeiramente informativo,
através de Relatórios Individuais
das Provas de Aferição (RIPA) e de
Relatórios de Fscola das Provas de
Aferição (REPA), ou seja, com dados
relativos ao desempenho dos alunos
que poderão ser realmente trabalha-
dos pelas escolas e incorporados no
planeamento pedagógico e didáti-
co, com o propósito de melhorar o
sucesso educativo dos alunos.
· Gostamos de pensar que o lAVE
existe porque as escolas existem,
existe porque os alunos existem,
existe para avaliar, é certo, mas
também para ajudar a ensinar e a
aprender. Todas estas alterações téc-
nicas nas provas elaboradas pelo lAVE
contribuirão, certamente, para uma
maior sintonia entre a avaliação ex-
terna e a flexibilidade curricular. Por
tudo isto, é para o lAVE muito claro
que, se a flexibilidade curricular con-
tribui necessariamente para melhores
aprendizagens, então conduzirá,
sem dúvida, a melhores resultados
nas provas de avaliação externa. Por
último, parece-nos que nenhuina fle-
xibilidade curricular pode sobreviver
sem avaliação externa, pois, em cada
professor, subsistirá sempre a dúvida:
será que os meus alunos estão mesmo
a aprender melhor? .n.
•Luís Pereira dos Santos é presidente do
Conselho Diretivo do IA VE, e Paula Simões é
diretoru de serviços de Avaliação Externa do
mesmo Instituto
UNKS DAS INQUIETAÇOE$ PfO.\GOciCAS
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