esbarra no meu braço, com leveza suficiente para deixar uma
trilha de arrepios para trás.
Eu pigarreio e dou um passo para trás.
Nós seguimos os patos até a água, seus grasnados
mostrando o caminho. A alguns passos da margem, Marley se
detém e olha para cima, sua mão imóvel acima dos grãos.
— Vai chover — ela diz, pensativa, sua cabeça inclinada para
trás para ver as nuvens pesadas e escuras acima de nós.
Eu sigo o olhar dela, assentindo. Algo no céu me faz lembrar
da noite da festa de formatura. O mesmo cinza agourento, as
nuvens densas de chuva.
Mais uma vez sou atingido pela sensação de que eu não
deveria estar aqui.
— Kim sempre gostou de chuva — eu digo, sacudindo a
cabeça para a ironia doentia de tudo isso.
Quando desvio o olhar, noto uma borboleta azul flutuando
acima do lago escuro, suas asas fazendo esforço para bater.
Algo está definitivamente errado com ela. Ela está voando,
mas quase não consegue. Ela se move na nossa direção com
dificuldade, chegando cada vez mais perto da água com cada
movimento das asas.
— Kim — Marley diz. Ouvir o nome dela na voz de Marley faz
minha cicatriz latejar de forma desconfortável. — O túmulo que
você sempre visita — Marley continua. — Ela era mais que uma
amiga, não era?
— Sim — eu digo, e uma avalanche de memórias desliza
para cima de mim. Eu consigo sentir minha mão na dela
enquanto ela me puxava pelo corredor vazio da escola na festa
do terceiro ano. Vejo ela correndo pelo campo de futebol depois
de eu ter feito o passe que ganhou o jogo. Sinto os lábios dela
nos meus daquela primeira vez, quando ela encontrou minha
mensagem em seu diário. — Ela era mais.
Eu me lembro da dor que vi nos olhos de Marley mais cedo.
Algo me diz que posso falar com ela sobre essas coisas, que ela
poderia entender de uma forma que a minha mãe e até mesmo
Sam não parecem conseguir. Mas eu nem sei por onde começar.
car0l
(CAR0L)
#1