COMBO SAUDE - VOLUME 1

(O LIVREIRO) #1

4 VITAMINA DA


CONTROVÉRSIA


Médicos italianos colocam a vitamina D entre os aliados contra o
coronavírus, estimulando uma arriscada busca por suplementos
sem prescrição. Saiba o que procede nessa história

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N


o mês de março, quando a Europa figu-
rava como epicentro da pandemia do
novo coronavírus. um documento vin-
do da Itália direcionou os holofotes
para a vitamina D. Dois médicos, tam-
bém professores da Universidade de Turim, consta-
taram que pacientes hospitalizados pela Covid- 19
apresentavam taxas baixas da substância — isto é.
tinham o que se chama tecnicamente de hipovitami-
nose D. A dupla juntou evidências sobre o elo do nu-
triente com a imunidade e preparou um relatório
que ganhou as manchetes dos jornais de todos os
cantos do planeta.
Os italianos, e outros profissionais na sequência,
sugerem que a adequação dos níveis seria um refor-
ço na proteção e no tratamento contra a doença. En-
tretanto, até agora não se tem notícia da publicação
oficial do estudo em nenhum periódico científico.
Também faltam detalhes sobre o trabalho, como
número de participantes envolvidos, condições cli-
nicas, entre outros aspectos fundamentais, para que
a substância seja realmente alçada ao posto de ini-
miga do vírus Sars-CoV-2.
Mesmo que não haja consenso sobre o uso da vi-
tamina D com função preventiva ou terapêutica
diante do patógeno, muita gente tem se agarrado a
qualquer lio de esperança — até porque o panorama
assusta. Mas. sem as devidas ponderações, tais men-
sagens podem levar ao uso de suplementação por
conta própria, o que é contraindicado pelos especia-

listas. Tanto que di versas sociedades médicas brasi-
leiras lançaram notas de alerta enfatizando o risco
do excesso da substância, que pode ser tóxico.
“O trabalho italiano aponta uma associação, ou
seja, não estabelece uma relação de causa e efeito”,
interpreta o endocrinologista Sérgio Maeda. presi-
dente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e
Metabologia — Regional São Paulo. “É como se dei-
xasse pistas para novas investigações”, explica. Ain-
da de acordo com Maeda, existe um tipo de pirâmi-
de quando se fala em evidências científicas. No
cume, estão pesquisas rigorosas cujos resultados são
realmente capazes de nortear diretrizes e recomen-
dações em saúde. Só que o tipo de análise conduzida
na Itália está longe desse patamar — daí por que não
dá para sair indicando vitamina D a torto e a direito.
Mesmo que o nutriente seja primordial ao sistema
imunológico, seria necessário um aprofundamento
nos estudos, com critérios mais rígidos, para validar
seu papel na Covid-19.
Parece que os esforços já começaram. “Há estu-
dos com a vitamina D em andamento mundo afora”,
observa a infectologista Rosana Richtmann. da So-
ciedade Brasileira de Infectologia (SBI). A médica
salienta, entretanto, que a substância não faz parte
do tratamento. Afinal, as etapas essenciais para se
chegar a um veredicto levam tempo. E. assim como
o Sars-CoV-2 esconde mistérios e desafia a ciência a
cada dia. o próprio efeito da vitamina precisa ser
mais bem compreendido. ©

SAÚDE MAIO 2020
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