EBOOK-TEMPO-DE-VOAR (1)

(MARINA MARINO) #1

Hora do almoço, volta para o hotel. Na recepção,
procura informações sobre casa à venda, sobre os amigos
do passado. Recebe cartão de uma imobiliária. A
cozinheira, passando por ali, ouve a pergunta sobre Zé
Mudinho e fala que nada sabe sobre os outros nomes,
mas que conheceu Mudinho. Morreu logo depois de
Padre Leôncio, e está enterrado perto da capelinha do
cemitério.


Banzeado, Jura perde o apetite e só trisca a salada.
Descansa pouco no sofá. Sai, pega a direção do rio. As
chuvas intensas continuam e a cheia é das maiores já
vistas por ali. O tempo continua carregado. Por fim, ele
chega ao igarapé da saudade. As águas quase cobrem
todo o tronco da árvore onde amarrava a canoa. Está
longe da margem, rodeada pelas jaçanãs. Jura acocora-
se no barranco. As pernas doem, a caminhada foi grande.


O olhar de saudade busca as jaçanãs. Quer sentir o
perfume, perfume de Zuleica. A doce Zuleica, bonita que
só. Quer pescar e comer os jaraquis ticados de dona Zefa,
quer mergulhar nas águas do seu igarapé. Queria tanto
ter voltado antes...


Das nuvens carregadas, começam os gotejos. Chove
de mansinho. De repente, um aguaceiro descomunal
escurece tudo, e a cortina de água turva os olhos. Jura
olha para o rio. As jaçanãs se desprendem da raiz, a cheia
arrebentou-lhes os cordões. E elas seguem se
distanciando da árvore, adentrando o rio. É a morte. Sem

Free download pdf