VOO LIVRE REVISTA LITERÁRIA - ANO 2 - Nº 13

(MARINA MARINO) #1

Sarau de Poesias, Comemorativo do nosso 1º aniversário


DO FIO À FONTE


Ando inundada de águas,


dessas que escorrem pelos dedos e a
gente nunca consegue segurar por
inteiro,


daquelas que caem dos olhos, ou se
guardam por lá inquietas,
aguardando tempestades maiores
para o súbito pranto,


das que nos guardaram a todos, um a
um, no ventre do outro mundo,
salvando-nos de apuros, apertos,
receios, abortos, tentativas vãs de
subornos súbitos de escapar deste
mundo,


das outras, as que descem nervosas,
carregando todo o estranhamento do
céu paralisado no desejo de chão,


das águas recém-nascidas da
correnteza, no grande espanto da
vida a espiar o riacho que persegue o
rio em cada inundação,


daquelas águas que já foram um fio e
hoje se enrolam em novelos a
caminho do mar,

das que mal se movem, em profundos
azuis, guardando secretos vestígios
de um tempo cansado de nãos,

das revoltas, alvoroçadas,
estranguladas na solidão imensa da
garganta estreita que sufocou um
grito tão tardio,

dessas águas feitas de prantos, de
medos guardados em cantos escuros,
de pânicos esgarçados em delírios
urgentes,

daquela que me aguarda, serena,
suportando o peso do barco na
planura quieta do horizonte, até o dia
do meu desaguar da vida em outra
Fonte.

(porque nós todos somos um fio da
Fonte)

Nic Cardeal
Curitiba/RS -Brasil
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