Veja São Paulo - Edição 2645 (2019-07-31)

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12 Veja São Paulo 31 de julho, 2019


de doenças ligadas à autoes-
tima e imagem, nota Valéria
Palazzo, psicóloga e coorde-
nadora do Grupo de Apoio e
Tratamento dos Distúrbios
Alimentares e da Ansiedade.
“Para que você tenha um
transtorno alimentar, é preciso
uma condição genética heredi-
tária. Mas não podemos deixar
de fora as redes e o ambiente
social”, explica Valéria. De acor-
do com a psicóloga, uma ques-
tão importante é escolher bem
quem seguir. “Você deve se
perguntar se a pessoa que você
está seguindo lhe dá algum
benefício, senão o Instagram
pode ser bastante prejudicial.”
Valéria afirma que, para quem
se sente muito dependente da
rede, “a solução mais radical
pode ser sair dela”.
O Hospital das Clínicas, que pertence à
Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo (USP), mantém o Grupo de Depen-
dências Tecnológicas há treze anos. Se no
início as pessoas procuravam tratamento por
achar que estavam utilizando demais o com-
putador, com a mobilidade dos celulares e o
surgimento das redes sociais o problema tor-
nou-se ainda mais comum.
“Indivíduos ficam, sim, dependentes de
redes sociais. E o ser humano é sensível às
avaliações pessoais. Nesse ambiente, a reper-
cussão das coisas negativas e positivas tem um
efeito muito maior”, diz Cristiano Nabuco,
coordenador do grupo. Segundo o psicólogo,
quanto mais alguém utiliza as redes, menos
presta atenção às experiências off-line. “O
excesso de uso cobra um preço alto: a negli-
gência da vida real.”
Todas as redes sociais lançam mão de um
“esquema de recompensa” que torna o uso
viciante, escreve em seu blog Tristan Harris,
ex-especialista em design do Google, onde
estudou ética da persuasão humana.


“Ao deletar o Instagram, comecei a viver de novo”, revela Laura
Passos. Moradora da Zona Oeste da capital, a moça, de 28 anos,
manteve uma relação difícil com a plataforma. “Passava por ex-
periências, saía de casa, só para ter o que postar”, conta a biblio-
tecária, que perdeu o hábito da leitura por causa do vício, que
ocupava grande parte das suas horas de lazer. Quando a função
Stories foi lançada, em 2016, Laura afirma que exercitava uma
busca diária para achar micropautas para compartilhar com os
seguidores: “Meu cotidiano era dividido de quinze em quinze
segundos”. A situação, que até então não era vista por Laura
como um problema, piorou no fim de 2018, quando ela quebrou
o pé em uma viagem ao interior do estado. “Era Natal, Ano-Novo,
e eu não tinha nada para postar, entrei em desespero”, relembra.
De repouso, em meio às fotos de fogos de artifício, viagens e
garrafas de champanhe compartilhadas no Insta, Laura desen-
volveu um quadro depressivo. No entanto, o uso da rede não
diminuiu. “Passei a entrar ainda mais.” Em janeiro último, depois
de muitas conversas com o psicólogo, ela decidiu deletar a con-
ta. “Fiz três viagens para fora do país neste ano. Se fosse em 2018,
iria passar o tempo todo tirando fotos dos lugares”, relata. “Sinto
que o Instagram é um local onde não existe tristeza. A vida das
pessoas é perfeita e inatingível”, diz. “Voltei a ler bastante, livros,
artigos. Antes eu consumia conteúdo apenas em posts.”

O REENCONTRO


COM OS LIVROS

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