quem somos e do que somos capazes, se realmente queremos caminhar
para um mundo melhor.
O sr. fala bastante em classes sociais. É marxista?
Isso vem muito por causa da sociologia. Mas não digo que sou marxista.
Fui ligado a isso por causa da política. Quando garoto, fui de uma
organização clandestina, a Política Operária, a Polop, a mesma da Dilma
Rousseff durante um tempo. Mas eu saí antes de ir para a luta armada.
Acabei indo para a contracultura, porque achei que a luta armada era
suicídio.
Como lida com as críticas ao seu trabalho, como as de que o sr. estaria
minimizando a escravidão ou o patriarcado?
Escrevo as minhas coisas. Conheço algumas pessoas que discordam e
discuto um pouco com elas. Mas essas que eu escuto são as pessoas que
eu respeito muito. Esse negócio de militante me xingando, me atacando,
eu não perco o meu tempo com eles, não.
Muitos brasileiros até pouco tempo atrás se orgulhavam de viver em um
país que combatia a corrupção. Essa narrativa desapareceu?
Claro. Tanto Bolsonaro quanto Lula são cínicos o suficiente para dizer que
são as almas mais honestas desse país. Há alguns anos, por sinal, ali pelo
começo da Lava Jato, escutei uma garota perguntar à mãe, num almoço, o
que era caixa 2. Como a mãe não se mostrou interessada no assunto, eu
expliquei. Disse que era mais ou menos o que sua mãe fazia, todo final de
ano, com relação ao imposto de renda: contratava um especialista, o
contador, para esconder o máximo possível do Fisco o dinheiro que ela
tinha recebido. A mãe ficou furiosa, claro. Mas a mocinha entendeu. As
pessoas adoram vociferar contra a corrupção, como se essa atitude lhes
carimbasse o visto de entrada no paraíso. Na verdade, elas não têm
autoridade nenhuma para condenar a prática. E elas sabem disso. Ficam
furiosas, na maioria dos casos, porque não são elas que estão roubando.
Alguma chance de a tolerância à corrupção diminuir no futuro?