Clipping Banco Central (2021-11-09-11)

(Antfer) #1

Seu desejo é sua maldição


Banco Central do Brasil

Folha de S. Paulo/Nacional - Poder
terça-feira, 9 de novembro de 2021
Cenário Político-Econômico - Colunistas

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Autor: Joel Pinheiro da Fonseca


Dar ao indivíduo aquilo que ele quer em todas as
situações não é a receita para sua felicidade. É sua
destruição. E, no entanto, a sociedade moderna se
torna cada vez melhor justamente em entregar a cada
um de nós, a cada segundo, aquela experiência que
melhor satisfaz nosso desejo.


Nossos estômagos ilustram bem isso. A história da
humanidade é, entre outras coisas, a história da luta
contra a fome.


Diversas ricas culturas alimentares foram desenvolvidas
pela transformação dos ingredientes disponíveis pela
criatividade humana. Mas seu preparo exige tempo e
sua fruição exige uma educação do paladar.


Eis que chega a junk food. Calorias baratas, imediatas e
que não exigem formação nenhuma: satisfazem
imediatamente os receptores de prazer do nosso
cérebro, com doses maciças de sal, açúcar e gordura. O
resultado é a obesidade e o diabetes. Passamos da
fome ao empanturramento.


Hoje a tecnologia faz com a informação e a expressão o
mesmo que já fez com a comida.

A internet deu acesso praticamente gratuito a toda a
informação produzida (não importa o quão caro tenha
sido alcançá-la) e as redes sociais deram a cada
indivíduo um megafone para falar mais alto que
qualquer canal tradicional, podendo ser recompensado
de acordo com suas visualizações ou curtidas.

As instituições do saber e da informação -universidades,
institutos de pesquisa, órgãos de imprensa- sempre
tiveram inúmeros problemas, mas garantiam um mínimo
de qualidade para a informação que era descoberta ou
veiculada.

Justamente por ser a única a dominar os meios de
difusão da informação, a grande imprensa profissional
gozava de autoridade junto à opinião pública. A
autoridade, mais do que de longos argumentos, vinha
da falta de alternativas.

A crise que vivemos corrói a própria existência da
verdade publicamente reconhecível. Não é que haja
discordâncias profundas acerca das conclusões; isso é
inclusive bem-vindo numa democracia vibrante.

O que estamos perdendo são os critérios comuns
mínimos que permitem distinguir o verdadeiro do falso
de uma maneira que todos aceitem e que possam, aí
sim, discutir.

A informação verdadeira nem sempre agrada. Quando
ela contraria nossas preferências, o mais fácil é procurar
outra. E hoje em dia sempre haverá outra.

Se você não gosta de espinafre, tem sempre um pacote
de bolachas te esperando. Haverá alguém em busca de
sucesso criando conteúdos sob medida para você (mas
a realidade objetiva, e não nossos desejos, deveria ser
a régua do conhecimento), assim como a própria
plataforma na qual você se move quer prender sua
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