(2016) Aventuras na História 156 - Os soldados de Deus

(AP) #1
Rio de Janeiro e atuou com os irmãos
Antunes e Edu no América. Três ir-
mãos na mesma equipe pareceu não
ser do agrado do técnico Evaristo de
Macedo, que autorizou seu emprés-
timo ao Madureira. O começo no tri-
color suburbano foi promissor, até
que o presidente do clube, Carlinho
Maracanã, o afastou sem explicações.
Sabedor da perseguição política que
se aventava, Nando achou necessário
“mudar de ares”, para seguir a car-
reira. Em 1968, foi contratado pelo
Ceará, e fez boas atuações. Seu fute-
bol chamou a atenção da equipe por-
tuguesa do Belenenses. Com a pro-
messa de receber o dobro do salário
da equipe cearense, Nando partiu
para Lisboa. Ao chegar, descobriu
que fora enganado e que o clube lhe
pagaria menos da metade do combi-
nado. Cabe lembrar que Portugal
vivia a ditadura de Salazar, desde
1932 chefe de Estado, e o presidente
do país, o Almirante Américo Tomás,
era torcedor fanático do Belenenses,
clube que presidira em 1944.
Dias depois, Nando recebeu no
seu hotel a visita de duas pessoas que
se identificaram como membros da
Polícia Internacional e de Defesa do
Estado, a Pide, organismo autônomo
da Polícia Judiciária do governo
local. Após ser interrogado e infor-
mado sobre a necessidade de entre-
gar os seus documentos, os visitantes
o alertaram que tinham conhecimen-
to sobre sua atuação no PNA em


  1. No dia seguinte, recebeu mais
    uma ameaça, desta vez do diretor da
    equipe portuguesa. Caso ele não acei-
    tasse assinar o contrato, por ser filho
    de português poderia ser obrigado a
    se alistar no Exército do país, e en-
    viado para as frentes militares que
    combatiam em Angola e outras colô-
    nias africanas.


Nando conseguiu ajuda e retornou
ao Brasil. Com o susto deixou o fute-
bol meio de lado. Também ficou em
silêncio, para não atrapalhar a carrei-
ra do irmão Edu, que fora artilheiro
do torneio Roberto Gomes Pedrosa de
1969 (o campeonato nacional daquela
época), e que deveria ser convocado
para a Copa do Mundo de 1970, e do
irmão caçula, Zico, que, ainda nas ca-
tegorias de base do Flamengo, encan-
tava a todos com seu futebol.
A não convocação de Edu para a
Copa do México foi recebida com
grande tristeza por toda a família,
mas nada comparável ao choque com
a prisão da prima, Cecília, e de seu
marido, José Novaes. Nando e um
primo médico foram visitar a tia, que
passara mal ao saber da prisão da fi-
lha. Todos, com exceção da tia, foram
presos por agentes da Delegacia de
Ordem Política e Social, Dops, que os
levaram ao DOI-Codi (Destacamento
de Operações de Informação – Centro

de Operações de Defesa Interna), ór-
gão de inteligência e repressão subor-
dinado ao Exército brasileiro. Foram
encapuzados para interrogatório e
sofreram ameaças. Foram liberados,
mas fichados como subversivos, o que
dificultou a volta de Nando ao futebol.
Em 1971, o jogador foi convidado
a atuar na equipe portuguesa do Gil
Vicente, mas não podia sair do país.
Seu pai teve a oportunidade de falar
com o então presidente do Conselho
Nacional de Desportos, o general Si-
zeno Sarmento, que se sensibilizou.
Graças ao militar, sua ficha voltou a
ser limpa, e ele atuou no Gil Vicente.
Porém, lesões sucessivas acabaram
por antecipar o fim da sua carreira,
aos 26 anos. Em dezembro de 2010,
a Comissão de Anistia, instalada pelo
Ministério da Justiça, reconheceu
que Nando foi um perseguido políti-
co da ditadura brasileira, e se tornou
o primeiro jogador de futebol a ser
anistiado no país.

Os irmãos
Zico, Edu,
Tonico,
Nando e
Antunes

AVENTURAS NA HISTÓRIA | 27

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