Exame Informática - Portugal - Edição 318 (2021-12)

(Maropa) #1
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dore Vic-20 ou fazê-lo funcionar numa caixa ATM ou numa
impressora. Mas é excelente que a tecnologia tenha chegado
a um ponto em que tudo pode correr o Doom.
Mas o que pensa desta paixão que as pessoas têm por algo
que foi criado há quase 30 anos? Não é muito tempo, mas
em anos tecnológicos é muito antigo...
É mesmo, mesmo antigo em anos tecnológicos. Penso que
o jogo marcou o início desta ideia de fidelidade ao design.
Estávamos no início do design de jogos de tiros na primeira
pessoa [FPS] mais complexos. E há o suficiente em Doom – é
assustador, é rápido, ainda é surpreendente – que as pessoas
jogam-no, não é aborrecido, ainda é um jogo entusiasmante,
independentemente de onde o jogas. Se colocasses o Wolfenstein
em qualquer dispositivo, quem se importaria com isso? Não
é um jogo assim tão divertido, foi divertido quando saiu, mas
comparado com o Doom era super simples.
Qual é a melhor memória que guarda desses tempos?
Fazer o Doom foi muito divertido, porque não tínhamos muita
pressão para lançá-lo. O Wolfenstein foi o primeiro jogo no qual
não tivemos pressão para lançar, não tínhamos um calendário
a cumprir como tivemos em todos os jogos antes desse, que era
de dois meses por jogo... Bam, bam, lançávamos a este ritmo!
Com o Wolfenstein, acabámos com os jogos feitos em dois meses
e pudemos finalmente gastar o tempo que precisávamos. De-
pois do Wolfenstein, ficou provado que gastar mais tempo, na
realidade, fazia um jogo muito melhor, portanto vamos usar o
tempo que for preciso para fazê-lo tão bom quanto possível. E o
Doom acabou por demorar um ano e isto foi, maioritariamente,
com cinco pessoas, depois tivemos uma sexta pessoa sensivel-
mente nos últimos quatro meses. Com o Doom, a tecnologia
estava tão avançada que não sabíamos o que podíamos criar
e passámos muito tempo a tentar perceber o que é o Doom e
que aspeto deveria ter, porque não havia exemplos de design
de níveis como o Doom tem.
Ainda fala com o John Carmack?
Falámos, apenas um pouco, há alguns meses. Normalmente
é porque algo novo acontece, trocamos alguns e-mails ‘Ei, o

A


empresa id Software está para o mundo dos videojo-
gos como os Beatles estão para o mundo da música:
inventaram um novo estilo, lançaram sucessos de
escala mundial, os seus membros tornaram-se em estrelas
de capa de revista e, mesmo após muitas décadas, são ainda
muitos os que os veneram e aos seus trabalhos. Esta é a forma
mais simples de apresentar John Romero, um dos fundadores
da id Software (juntamente com os não menos lendários John
Carmack, Tom Hall e Adrian Carmack), a todos os que ainda
não o conhecem. Na bagagem traz o desenvolvimento de mais
de 100 videojogos, a ‘cruz’ de ter ajudado a definir um dos
estilos mais lucrativos de sempre, os first person shooters (tiros
na primeira pessoa), e a responsabilidade de ter mostrado que
também nos videojogos podem existir ‘rock stars’ tão gran-
des quanto músicos, atores e escritores, arrastando consigo,
ao vivo, nos computadores e nas consolas, legiões de fãs. No
evento Future.Works, organizado pela empresa Landing.jobs,
no qual falámos com Romero, a sala foi pequena para receber
todos os que quiseram ouvir uma lenda viva dos videojogos.
O Doom pode ser jogado no iPod, em calculadoras, no Twitter...
...Em testes de gravidez...
Também tinha esse aqui. Alguma vez pensou que algo que
criaram viria a tornar-se uma parte tão fundamental da
cultura da internet e da tecnologia?
Não, nunca pensamos isso. O que sabíamos é que ia ser um
grande jogo. Foi baseado no Wolfenstein [1992] e estávamos a
tentar fazer algo melhor. Estávamos sempre a pensar, como
vamos superar o jogo anterior? Essa era a nossa mentalidade.
Não pensámos que o jogo viesse a tornar-se num clássico,
queríamos fazer a melhor coisa que nos imaginávamos a jogar
e foi a única vez que fizemos isso no tempo em que desen-
volvemos todos os nossos jogos. O Doom [1993] foi aquele no
qual pensamos que devíamos passar o tempo a tentar fazer
isso. Mas quando decidimos torná-lo aberto e disponibilizar o
código-fonte para o mundo, era como um MS-DOS ou sistema
Windows que as pessoas podiam recompilar. Foi a única razão
para vê-lo a funcionar numa Commodore 64, numa Commo-


UMA LENDA VIVA


O criador de algumas das franquias de videojogos mais icónicas
e bem sucedidas de todos os tempos – Wolfenstein 3D, Doom e Quake


  • fala das memórias dos tempos de glória, das avozinhas viciadas
    em jogos de smartphone, das transformações que a indústria enfrenta
    e revela-nos qual considera ser o jogo mais influente de sempre


Tex t o Rui da Rocha Ferreira Fotos Álvaro Isidoro

JOHN ROMERO
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