Exame Informática - Portugal - Edição 318 (2021-12)

(Maropa) #1
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que pensas disto?’ ou ‘E se fizessemos isto?’, mas penso que
o John está interessado em Realidade Virtual, está interessado
em Inteligência Artificial, não está muito interessado em fazer
jogos, se é que me percebes. Ele está mais do lado da tecno-
logia. Quando estávamos juntos, ele era excelente, porque
fazíamos jogos, nós desenhámos, ele programou a tecnologia e
foi importantíssimo em fazer com que as coisas saíssem como
saíram, mas, sozinho, ele escolheria programar a tecnologia.
Era mais difícil fazer jogos na década de 1990 ou agora?
A tecnologia está mais avançada, mas a concorrência é
muito maior.
Fazer um jogo mesmo bom, no passado, era definitivamente
muito mais difícil do que é atualmente. Agora tens motores
gráficos. No passado a tecnologia era a parte difícil, não tinhas
suporte para o hardware tecnológico, mas à medida que o
tempo foi passando e a tecnologia introduziu as unidades de
processamento gráfico [GPU] e placas de aceleração de vídeo,
a tecnologia acelerou. Agora o que é difícil é fazer jogos novos
realmente bons por causa do design, não por causa da tecnolo-
gia. Descarregas o Unreal ou o Unity e começas a fazer coisas.
Mas o que vais fazer é o que é importante – estás a fazer coisas
derivativas ou estás a desafiar os limites ao fazer algo que é
realmente bom? E os valores de produção aumentaram imenso,
isso não existia no passado, agora os valores de produção são
muito altos. Criar um design que as pessoas ainda não viram,
uma e outra vez, é o que distingue o teu jogo de tudo o resto.
Ter a ideia primeiro e depois a competência para executar
essa ideia, num nível de qualidade, é o que faz os jogos bons.
Agora o dinheiro importa mais do que novas ideias, novos
designs, novas formas de jogabilidade?
Não, as pessoas podem fazer jogos em casa, quando quiserem.
O Minecraft foi feito por uma pessoa, em casa. Não foi preciso
qualquer dinheiro.
Mas esse não é um bom exemplo. Só há um Minecraft...
Claro, mas também tens muitas empresas independentes que
começaram com pessoas que faziam jogos à noite – quando a
id Software começou, fazíamos os nossos jogos à noite. Todos
podem começar dessa forma. Para alguém que pensa que vai
finalmente começar a fazer jogos quando alguém lhes der
dinheiro... isso não vai acontecer. Tens de ter um histórico
comprovado para conseguires dinheiro das pessoas. És bom o
suficiente para tornar esta ideia uma realidade? Caso contrário
os investidores só estão a atirar dinheiro pela janela fora – mas
isso acontece muitas vezes também.
E o outro lado, os jogadores? Parecem ser mais exigentes,
ao ponto de um jogo adiado resultar em ameaças de morte...
Todos são jogadores hoje em dia. A avozinha é uma jogadora,
está a jogar jogos de combinação de três peças, e há pessoas a
jogar jogos narrativos. Existem mais jogos do que alguma vez
existiram e todos estão a jogá-los por causa dos dispositivos


móveis. Ainda há muitas pessoas que são jogadores hardcore,
mas o que são jogadores hardcore? Alguém que joga jogos
de combinação de três peças oito horas por dia é um jogador
hardcore. Tens de saber qual o teu espectro de idade e o que
essas pessoas gostam. Depois preparas o jogo em função dessas
pessoas. Se sabes que vão ficar irritadas por o jogo ter sido
adiado, não o anuncies até saberes que está pronto para sair.
Vi numa entrevista que gosta de jogos criados por estúdios
independentes [indie]. Os modelos de subscrição, como
o Xbox Game Pass, vão beneficiar ou prejudicar os jogos
indie a longo prazo?
Não penso que vá prejudicar. O Game Pass é incrível. Enquanto
programador indie, a exposição que consegues através do Game
Pass é massiva. A quantidade de pessoas que vão entrar no teu
jogo a partir dali, nunca o conseguirias de outra forma, é de
loucos. O Game Pass é bom para os indies terem exposição,
porque esta exposição pode levar a outras vendas. Eu descar-
reguei o jogo através do Game Pass, estes programadores são
incríveis, como os do Firewatch, agora quero todos os jogos que
estas pessoas fizeram. ‘Oh, não estão no Game Pass’, mas vais
comprá-los na mesma. É um marketing excelente.
Muitos dizem que ‘há demasiada violência nos jogos’. Vão
manter-se como um campo de liberdade ou vamos começar
a ver barreiras éticas a aparecerem?
Não. Temos classificações etárias, é isso que tens. É o mais
limitador que alguém estará disposto a aceitar. A indústria
do cinema faz isto desde sempre. E não há classificações que
impeçam as pessoas de ler livros. Os videojogos têm classifica-
ções e essas são as barreiras que mantêm longe as pessoas que
não devem ver aquela tipologia de conteúdo, não penso que
aconteça algo para além disso. O Steam disse que não permite
jogos com NFT, porque é um jogo de fortuna e azar e eles não
querem lidar com isso – a plataforma pode ditar regras, mas as
plataformas que temos até agora não ditaram qualquer regra.
Existem jogos para adultos, com classificação para maiores de
18, e vão continuar a ser feitos.
Para si, qual é o jogo mais influente de sempre?
Geez... Não tenho a certeza de qual será. O Pac-Man foi massivo,
a febre do Pac-Man estava em todo o lado, foi muito influen-
te... para mim foi. Quebrou os padrões de design da década de
1970 e introduziu a forma moderna de design japonês, que era
completamente diferente da ocidental. Para mim foi enorme,
mudou tudo o que pensava sobre design. Gostava de programar,
gostava de fazer jogos, mas aquele jogo mostrou-me o potencial
do que os jogos podiam ser. O Pong foi bom para introduzir as
pessoas aos videojogos, mas para mim, o design do Pac-Man
introduziu toda uma nova forma de jogar que nunca tinha exis-
tido. Podes dizer que se não fosse pelo Pac-Man, não haveria
um Wo l f e n s t e i n, não haveria um Doom, não haveria nada disto,
aquele jogo influenciou tudo o que fiz. „

Natural do estado do Colorado, EUA, tem
ascendência azteca e cherokee, razão pela qual,
segundo o próprio, tem os longos cabelos que
caracterizam a sua imagem. Agora com 54 anos,
começou a programar jogos em 1979 em mainframes
de universidades. É casado, desde 2012, com a
também designer de videojogos Brenda Romero, com
quem vive atualmente em Galway, Irlanda.

JOHN ROMERO

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