Micro
- EXAME. DEZEMBRO 2021
umas aprendi o que não se deve fazer, mas
aprendi.”
O REGRESSO DOS PRIVADOS
Ao longo da sua carreira trabalhou com
seis acionistas, desde os donos privados
antes do 25 de Abril, ao Estado, aos co-
lombianos da Bavária, ao grupo português
Parfil, à Scottisch & Newcastle e, por fim,
aos holandeses Heineken.
Nuno Pinto de Magalhães recorre aos
seus dotes diplomáticos, limitando-se a
dizer, apenas, que tinham “estilos dife-
rentes de gestão”. No entanto, reconhe-
ce que os colombianos tiveram um papel
mais difícil por terem herdado uma em-
presa pública complicada. “Com os priva-
dos, instalaram-se critérios com base na
meritocracia e regras de gestão mais pro-
fissionais. Deixámos de ser liderados por
F
oi o acaso que o levou a
encontrar um trabalho
temporário na Central de
Cervejas, em outubro de
- Um acaso que lhe
viria a preencher a sua vida pessoal e pro-
fissional ao longo de 47 anos, até chegar à
presidência do conselho de administração
desta empresa.
Poucos meses tinham passado após a
revolução de Abril, o País vivia uma situa-
ção conturbada e as mudanças administra-
tivas eram tomadas em catadupa. Devido
à incapacidade de o Ensino Superior con-
seguir absorver todos os candidatos à fre-
quência do ano letivo que se iniciava nesse
outono, foi criado o Serviço Cívico Estu-
dantil, que obrigava todos os alunos que
terminassem o antigo sétimo ano do liceu
a trabalharem em prol do Estado durante
um ano, regra geral a fazer campanhas de
alfabetização no Interior do País. Os únicos
que ficavam isentos deste serviço eram os
que já estivessem no mercado de trabalho.
Uma medida que levou muitos jo-
vens, acabados de terminar o liceu, en-
tre os quais Nuno Pinto de Magalhães, a
procurarem empregos temporários. “Na
altura, soube que a Central de Cervejas ti-
nha aberto vagas para trabalhadores even-
tuais e decidi inscrever-me, como forma
de ocupar aquele ano até que pudesse en-
trar para a Faculdade de Direito”, lembra.
Assim que o jovem Nuno entrou pela
porta da antiga sede da Central de Cerve-
jas, em Lisboa, na Avenida Almirante Reis,
ao lado da Portugália, foi-lhe dada a pri-
meira tarefa, a de fazer o registo de todo
o património mobiliário, desde as secre-
tárias às máquinas de calcular, passando
pelas registadoras, pelos armários, entre
muitas outras coisas, conhecendo, assim,
ao pormenor os cantos daquela que viria a
ser a sua “casa” por quase cinco décadas.
O País vivia um dos períodos mais
conturbados da sua História, a tensão
social sentia-se nas ruas e tiveram início
as ocupações das grandes empresas. Foi
o que acabou por acontecer à Central de
Cervejas em janeiro de 1975. Os patrões
foram saneados e foi eleita uma comis-
são para tomar as rédeas da gestão. Uma
das primeiras medidas foi a de passar a
efetivos todos os trabalhadores eventuais.
Com apenas 18 anos e com a expecta-
tiva de cumprir um único ano na empre-
sa até ingressar na Faculdade de Direito,
Nuno Pinto de Magalhães vê-se, nova-
mente por um acaso, incorporado nos
quadros. Ocupou funções de escriturário
e, no ano seguinte, deu entrada na univer-
sidade. “Nessa altura disseram-me que,
já que estava a estudar Direito, poderiam
aproveitar melhor as minhas competên-
cias noutras áreas e decidiram colocar-me
nos recursos humanos.”
Teve funções em quase todos os de-
partamentos, com a exceção de dois: o
financeiro e a área técnica da produção.
“Muitas vezes questionei-me se seria a
pessoa exata para o cargo para o qual es-
tava a ser nomeado. Mas como gosto de
novas experiências, encarei as mudanças
como desafios, e acabei por responder em
todos ao que era exigido”, diz.
Ainda hoje admite que o seu grande
trunfo foi o de saber ouvir as pessoas mais
velhas e experientes. “Os mais novos de-
vem aprender com aqueles que têm mais
experiência. Nós somos o legado de toda
a gente que aqui passou. Aprendi com to-
das as pessoas com quem trabalhei. Com
NUNO PINTO MAGALHÃES/Chairman da Central de Cervejas
O fiel cervejeiro
Ao longo de 47 anos de carreira, Nuno Pinto de Magalhães
trabalhou com seis acionistas, passou por uma nacionalização,
uma privatização e respondeu a 18 presidentes. É, desde
o passado dia 1 de julho, presidente do conselho
de administração da Central de Cervejas, para onde
entrou em 1974, com apenas 18 anos
Texto Paulo M. Santos Fotografia Marcos Borga